sexta-feira, 25 de junho de 2010

Dia de Catalano

Tem dias, como o de hoje, em que está calor na rua, mas frio dentro dos lugares e na sombra, e em que eu sinto cheiro de asfalto e o céu está azul e pontilhado de nuvens gordinhas, ali e aqui... Tem dias como o de hoje que eu chamo de dia de Catalano. São dias que me levam de volta a um tempo que não era bom, nem posso dizer que era melhor do que o de hoje, mas a um tempo para o qual eu gostaria desesperadamente de voltar.

Hoje passei na frente da escola. Estava vazia, dia de jogo da seleção. As cortinas não são mais beges clarinhas, de tecido grosso, mas azuis e finas, cheias de remendo de fitas adesivas. Os muros continuam pixados, mas não são mais os mesmos desenhos. O boteco da esquina, que só vendia coisas de boteco, hoje vende artigos de papelaria e tem internet.

Na outra esquina, havia uma lixeira dessas de pé alto, instalada pelo morador da casa para colocar seu lixo. Ela não existe mais e agora tem uma planta no local. Sumiu a lixeira assim como sumiram os cursos técnicos de publicidade e contabilidade, que minhas amigas Regiane e Andréa, respectivamente, optaram por cursar.

Os portões, antes cinza escuro, foram pintados de marrom. Das grandes árvores que havia do lado esquerdo de quem fica de frente ao prédio, cortaram pelo menos duas e acho que só tem uma. O prédio de uma antiga fábrica na outra esquina foi demolido e hoje é um posto de gasolina. O prédio em frente, residencial... Não me lembro se ele já existia quando eu me sentava naquelas carteiras. No lugar onde ele estacionou uma vez um Monza (daqueles modelo tubarão, acho que era verde, e era lindíssimo) hoje tem um ponto de ônibus.

Antes para se divertir tinha de subir até a praça, hoje é só ir em um dos dois shoppings, a dois minutos do prédio. Onde estão os shoppings eram estacionamentos. Do outro lado, na Radial, havia ainda um grande terminal de ônibus. Os canos em que ele se sentava na fila do Jardim Soares não estão mais lá. A linha de ônibus continua, porém. O muro próximo da bilheteria onde eu esperava ele passar e as amigas chegarem ainda existe, mas está escondido por grades e cabines de lojas.

As nossas salas ainda estão lá. A minha, a sala quatro, do 1o O, a dele, a sala sete, do 1o R. Ainda continuamos separados, ele lá, eu aqui. Não foi a primeira vez que eu o vi, mas foi quando eu olhei para os olhos dele e ele olhou nos meus que tudo aconteceu. Eu me perguntava diariamente como seria, depois de ter ficado presa naquele olhar, viver sem aqueles olhos. Mal conseguia passar o final de semana e os feriados sem eles. Como aguentaria o recesso de julho? E as férias de final de ano, que demoravam uma eternidade para passar? Mal sabia eu que teria de passar o resto da minha vida sem aqueles olhos.

Hoje, na porta da escola, eu chorei. Pior do que saber que aqueles olhos não seriam meus, foi o dia em que eu soube que eles não seriam abertos para mais ninguém. E em dias de Catalano, tudo o que eu queria era fechar os meus e, quando abrir, dar com os dele me olhando.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Fotos

Mantenho fotos de uma certa pessoa em vários lugares. No criado-mudo, no celular, no laptop, no Ipod. Ninguém entende bem porquê, mas ninguém pergunta. Além da pessoa em questão ter um rosto lindo, eu a mantenho por perto porque com ela aprendi uma coisa importante. Não apenas aprendi, pois isso eu já tinha aprendido. Eu consegui aceitar, na maior parte do tempo, isso. Que as coisas são o que são, estão onde estão e acontecem como acontecem porque devem estar onde está, ser o que são e acontecer da forma e no tempo que devem acontecer.

Tem vezes que penso nisso e me sinto bem, calma. Mas a maior parte das vezes eu fico muito triste, e me sinto tremendamente impotente. E toda vez que sinto impotência, me dá um tremendo acesso imenso de raiva, que desconto correndo de carro por Sampa... ou chorando... ou cantando alto alguma música do Guns dentro do carro... ou dizendo palavrões e xingando alguém no trânsito por qualquer bobagem... Tenho sentido muito isso, essa raiva enorme, que é uma vontade de destruir. Destruir qualquer coisa. Destruir a mim ou destruir algo ou destruir alguém. Em boa parte dos dias, do ano passado para cá, tenho me sentido assim, raivosa e destrutiva. Uma raiva surda, silenciosa, que parece estar espreitando a procura de um momento para dar o bote.

A cada dia, o esforço para controlar isso é maior e a energia de que preciso é menor. Parece que estou andando numa corda bamba e que, a qualquer momento, vou despencar. Sinto que tenho um fiozinho muito fino e curto de controle sobre mim mesma, mas que a qualquer momento ele vai escapar das minhas mãos. Espero apenas que, quando isso ocorrer, nenhum inocente esteja por perto.