terça-feira, 6 de julho de 2010

38 anos

Hoje, ele faria 38 anos. Hoje tem muita gente pensando como ele estaria. Estaria mais gordo? Teria cabelo branco ou estaria ficando sem cabelo? Ou continuaria com o cabelo farto, fofo, castanho, cortado curto, mas não muito, para esconder um pouco as orelhas? Usaria óculos de grau? Teria voltado para a escola, teria feito faculdade? Que curso? Teria se casado? Teria quantos filhos? Seria um pai muito bravo? Se tivesse uma menina, iria ser ciumento como era com todo mundo da família? Continuaria achando que todo mundo tinha de emprestar as coisas para ele, mas que não deveria fazer o mesmo com suas coisas? Continuaria escondendo as coisas que não queria que pegassem emprestado, em lugares inusitados, como fazia com o macacão Lee, que ficava escondido embaixo do sofá, literalmente? Continuaria pegando escondido um perfume, tênis ou camiseta dos irmãos? Teria colocado suas crianças no grupo de escoteiro, como ele foi? Estaria ainda com aquele ar de superioridade estampado no rosto? Com os olhos sempre brilhando e a boca sempre parecendo que ia sorrir irônicamente? Continuaria andando de cabeça tão erguida, sempre sem tropeçar? Ainda sairia batendo porta quando o contrariasse? Continuaria valentão, continuaria não levando desaforo para casa? Pularia janelas e subiria em muros atrás de pipa, para brincar com o filho? Teria adotado barba, bigode, ou continuaria com o rosto liso para a gente ver as covinhas e as pintinhas? Estaria trabalhando no quê? Ainda estaria casado? Com quem? Trairia a mulher? Se divorciaria? Casaria novamente? Começaria a beber ou fumar depois de velho? Frequentaria a igreja? Ainda curtiria uma moto, pular de para-quedas? Teria um carro de tiozinho ou um de boy? Ainda dançaria, como gostava de fazer? Seria um torcedor da Mancha e bateria cartão em estádios de futebol pra ver o Verdão jogar? Ainda seria fã de pizza e da geléia que a avó fazia? Ainda usaria o Stiletto e roupas de marca? Teria viajado? Para onde? Continuaria fazendo bolo de chocolate e vitamina de leite e frutas? Continuaria oferecendo apenas um copinho de vitamina para os outros e tomando todo o resto sozinho, no copo de liquidificador? Continuaria com a pele oleosa e com cravos e espinhas? Continuaria usando aquele pó branco para acabar com cravos e espinhas? Continuaria sujando todo o banheiro para usar o tal pó? Continuaria a fazer brincadeiras bobas e fazendo todo mundo rir das suas pegadinhas? Teria sido reservista ou iria entrar numa das Forças Armadas? Iria servir no Exército, Marinha ou Aeronáutica? Principalmente: teria parado de arriscar a sua vida com coisa idiota, como fez há 20 anos, nos deixando aqui numa tristeza infinita?

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Dia de Catalano

Tem dias, como o de hoje, em que está calor na rua, mas frio dentro dos lugares e na sombra, e em que eu sinto cheiro de asfalto e o céu está azul e pontilhado de nuvens gordinhas, ali e aqui... Tem dias como o de hoje que eu chamo de dia de Catalano. São dias que me levam de volta a um tempo que não era bom, nem posso dizer que era melhor do que o de hoje, mas a um tempo para o qual eu gostaria desesperadamente de voltar.

Hoje passei na frente da escola. Estava vazia, dia de jogo da seleção. As cortinas não são mais beges clarinhas, de tecido grosso, mas azuis e finas, cheias de remendo de fitas adesivas. Os muros continuam pixados, mas não são mais os mesmos desenhos. O boteco da esquina, que só vendia coisas de boteco, hoje vende artigos de papelaria e tem internet.

Na outra esquina, havia uma lixeira dessas de pé alto, instalada pelo morador da casa para colocar seu lixo. Ela não existe mais e agora tem uma planta no local. Sumiu a lixeira assim como sumiram os cursos técnicos de publicidade e contabilidade, que minhas amigas Regiane e Andréa, respectivamente, optaram por cursar.

Os portões, antes cinza escuro, foram pintados de marrom. Das grandes árvores que havia do lado esquerdo de quem fica de frente ao prédio, cortaram pelo menos duas e acho que só tem uma. O prédio de uma antiga fábrica na outra esquina foi demolido e hoje é um posto de gasolina. O prédio em frente, residencial... Não me lembro se ele já existia quando eu me sentava naquelas carteiras. No lugar onde ele estacionou uma vez um Monza (daqueles modelo tubarão, acho que era verde, e era lindíssimo) hoje tem um ponto de ônibus.

Antes para se divertir tinha de subir até a praça, hoje é só ir em um dos dois shoppings, a dois minutos do prédio. Onde estão os shoppings eram estacionamentos. Do outro lado, na Radial, havia ainda um grande terminal de ônibus. Os canos em que ele se sentava na fila do Jardim Soares não estão mais lá. A linha de ônibus continua, porém. O muro próximo da bilheteria onde eu esperava ele passar e as amigas chegarem ainda existe, mas está escondido por grades e cabines de lojas.

As nossas salas ainda estão lá. A minha, a sala quatro, do 1o O, a dele, a sala sete, do 1o R. Ainda continuamos separados, ele lá, eu aqui. Não foi a primeira vez que eu o vi, mas foi quando eu olhei para os olhos dele e ele olhou nos meus que tudo aconteceu. Eu me perguntava diariamente como seria, depois de ter ficado presa naquele olhar, viver sem aqueles olhos. Mal conseguia passar o final de semana e os feriados sem eles. Como aguentaria o recesso de julho? E as férias de final de ano, que demoravam uma eternidade para passar? Mal sabia eu que teria de passar o resto da minha vida sem aqueles olhos.

Hoje, na porta da escola, eu chorei. Pior do que saber que aqueles olhos não seriam meus, foi o dia em que eu soube que eles não seriam abertos para mais ninguém. E em dias de Catalano, tudo o que eu queria era fechar os meus e, quando abrir, dar com os dele me olhando.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Fotos

Mantenho fotos de uma certa pessoa em vários lugares. No criado-mudo, no celular, no laptop, no Ipod. Ninguém entende bem porquê, mas ninguém pergunta. Além da pessoa em questão ter um rosto lindo, eu a mantenho por perto porque com ela aprendi uma coisa importante. Não apenas aprendi, pois isso eu já tinha aprendido. Eu consegui aceitar, na maior parte do tempo, isso. Que as coisas são o que são, estão onde estão e acontecem como acontecem porque devem estar onde está, ser o que são e acontecer da forma e no tempo que devem acontecer.

Tem vezes que penso nisso e me sinto bem, calma. Mas a maior parte das vezes eu fico muito triste, e me sinto tremendamente impotente. E toda vez que sinto impotência, me dá um tremendo acesso imenso de raiva, que desconto correndo de carro por Sampa... ou chorando... ou cantando alto alguma música do Guns dentro do carro... ou dizendo palavrões e xingando alguém no trânsito por qualquer bobagem... Tenho sentido muito isso, essa raiva enorme, que é uma vontade de destruir. Destruir qualquer coisa. Destruir a mim ou destruir algo ou destruir alguém. Em boa parte dos dias, do ano passado para cá, tenho me sentido assim, raivosa e destrutiva. Uma raiva surda, silenciosa, que parece estar espreitando a procura de um momento para dar o bote.

A cada dia, o esforço para controlar isso é maior e a energia de que preciso é menor. Parece que estou andando numa corda bamba e que, a qualquer momento, vou despencar. Sinto que tenho um fiozinho muito fino e curto de controle sobre mim mesma, mas que a qualquer momento ele vai escapar das minhas mãos. Espero apenas que, quando isso ocorrer, nenhum inocente esteja por perto.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Eu entendo

Eu entendo... É meu medo de envelhecer. É meu medo de ter de lidar com a morte de pessoas mais velhas do que eu. É o medo de ter de ser pais dos meus pais. É o medo de olhar para trás e ver que eu queria que tudo fosse completamente diferente. É o medo de enfrentar o fato de não haver mais sonhos, planos, nada que motive a caminhada do dia-a-dia. É o medo de perder o pouco de bom que foi conquistado nesse percurso cheio de medo, insegurança, sofrimento, e vazio de amor, amor por mim e amor pelos outros.

Eu entendo o que sua volta representa, ou melhor, eu entendo porque fui buscá-lo, porque decidi enfrentar a única dor que eu não havia enfrentado no meu passado. Entendo que é um problema sério que eu tenho, que estou profundamente doente, estou com a alma doente. Isso não tem nada a ver com você, não é sobre você, realmente. Acho que as coisas relacionadas a você nunca foram realmente sobre você, e sim sobre mim mesma, não é?

Eu entendo que tenho o raciocínio das mulheres que apanham e acham que aquilo é sinal de atenção. É uma mesquinharia mesmo. Eu entendia como funcionava naquela época. Eu era uma menina horrorosa e pensava que a sua crueldade de dar atenção numa hora para na outra ignorar era algo importante. Eu pensava que, afinal, com tantas outras em volta, você prestar atenção em mim, para depois me ignorar, era importante. Na minha cabeça, eu era algo, para você se dar a tanto trabalho, não era assim que eu pensava? Eu sempre me achei tão pouco que qualquer coisa que recebia era bom. Você sabia que eu era assim. Eu nunca reconheci em voz alta a sua crueldade. Mas aquilo era cruel. E você se divertia sendo cruel, não é? Eu sabia, e eu fingia não notar, mas se tem uma coisa que você sabe ser é ser cruel.

Isso me espanta. Ainda hoje, depois de tanto tempo, depois da grande lição que eu acho que você levou, a sua crueldade continua. Você não sabe... Não, você sabe, de onde você está, hoje, você pode sentir o que causa em mim. Você sabe o tamanho da raiva que sinto agora. O tamanho da mágoa. Eu tenho mágoa de você. Por você ter me dado atenção pra me ignorar dois segundos depois. Por você sorrir e fechar a cara no dia seguinte. Por ter me maltratado na única vez que eu criei coragem para lhe dirigir a palavra. Por não querer que te achasse. Por não querer que te visse. Por fazê-los se afastar de mim agora que os achei e, com eles, era como se estivesse perto de você.

Você nunca me quis por perto e continua não querendo. Eu nunca entendi isso. Eu tenho certeza de que você não gosta de mim. Agora eu sei que você nunca gostou de mim. Eu consigo quase ouvir você me mandando para o inferno por insistir. Só que nunca entendi porque sua bronca. Qual foi meu erro? Ah é... me atrevi a gostar de você. Eu, a feiosa, imagina, pensando em querer algo com Vossa Alteza. Não é? Você achava um desaforo eu cogitar a hipótese de pisar no mesmo lugar que você, não é? Eu não era nada. Como, eu, um nada, querendo algo com você? Eu preciso ficar no meu lugar, você sempre tá mostrando isso para mim. Até hoje é assim.

É, eu tenho mágoa. Eu tenho raiva de você. Na verdade, eu tenho um ódio, um ódio profundo. Um ódio tão grande que não cabe no meu coração, na minha mente, não cabe em mim. Era isso que você queria ouvir de mim, não é? Você queria que eu parasse de disfarçar, falando que sou grata ao fato de ter ido para frente, em grande parte, por sua causa, e que eu entendi que você não tinha obrigação de gostar de mim. Porque, na real, você tinha de gostar de mim, é isso o que eu penso. Então está aí, eu te odeio! Muito! Eu gostaria de poder te encontrar para gritar isso na sua cara e te socar, te bater tanto, até ver você sangrando. Gostaria de te ver e poder gritar com você, e falar sobre o fato de que você não tem o direito de desfazer dos outros porque se acha ou é melhor do que os outros. Queria te falar que você, com sua arrogância e seu nariz empinado, foi um dos que colocou uma pá de cal no que eu podia ter dado de melhor para alguém.

Queria te dizer que se eu perdi uma pessoa que podia me fazer ter a coragem, a audácia, a segurança que sempre me faltou, você perdeu alguém que podia ter te levado pra frente. Que eu não era a merda que você achava que eu era, que o fato de eu usar óculos e não ter roupa de marca e não ser bonita não me fazia menor do que aquelas que te rodeavam. Aquela que estava com você, o que ela fez? Beijou seu melhor amigo. Ela te impediu de terminar como você terminou? Não. Ela deixou você andar para trás. Eu jamais faria isso. Eu era uma pessoa que podia ter te levado pra frente. Eu queria chegar onde você está hoje e rir da sua cara, porque eu sou o que sou e estou aqui e você, no que se transformou e onde está? Quem está melhor, hein?

Infelizmente, eu sei que tudo isso se desmancharia no ar quando visse seu sorriso. Eu odeio você. Mas me odeio muito mais.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Um pedido

Ontem, eu vi um céu estrelado como há muito não via em Sampa. A noite estava quente, minhas cachorras estavam "discutindo" quem ia comer em que bacia, com rosnados ameaçadores, no fundo do quintal. Um ventinho leve que refrescava pouco, mas ajudava a enfrentar o calorão. Eu desliguei as luzes de casa e fiquei no quintal, encostada na parede, enquanto esperava as cachorras comerem, pois não tive coragem de deixar as duas sozinha "discutindo" seus direitos; ia acabar em pancadaria se eu não ficasse por lá. Eu olhei as estrelas, pensando onde ele está hoje, e imaginando onde e como ele estaria hoje se estivesse ainda por aqui. Fechei os olhos e fiz um pedido. Queria um beijo, um abraço, um toque, qualquer coisa, queria senti-lo uma vez só, uma única vez. O lembrei do quanto eu sonhava com ele, das coisas que imaginariamente eu e ele faríamos juntos, de tudo que eu poderia dar a ele em troca de ver aquele sorriso que revelava as covinhas mais lindas que já vi. Fui dormir e não tenho ideia do que sonhei, mas ele estava lá. Vi seu rosto, seu cabelo, seu peito sem camisa, seu braço. Vi pedaços dele e não ele inteiro, e não lembro de mais nada, só dos pedaços dele que eu vi no sonho. Eu sei que foi algo bom, porque eu sequer fiz questão de lembrar o que foi o sonho, o que eu me lembrei já me deixou satisfeita. E me sinto como se tivesse criado um mundo paralelo onde eu posso viver com ele tudo o que eu quis e não pude, mas a sensação é tão forte que eu realmente cedi a loucura e estou vivendo nesse mundo. Saí do plano real. Eu sei que isso é doentio e Freud iria adorar me transformar em objeto de pesquisa. E o pior é eu ter consciência de que está tudo errado e, mesmo assim, não conseguir parar. E está tudo tão doido que até parece que eu escuto ele me falando para eu sair dessa, encontrar alguém, tocar minhas coisas, viver a vida que eu tenho e que ele gostaria de ter e não tem... Estou imaginando como eu serei aos 65, 70 anos, quando começar a bater pino de verdade. Acho que ficarei igual a Bibiana do "O Tempo e O Vento" de Érico Veríssimo. Na velhice, ela ficava alucinando e vendo o seu Capitão Rodrigo o tempo todo. Acho que serei igualzinha, se eu chegar a ser velha e caduca.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Desgostos políticos

Adendo 1 - Só ontem, dia 2 de fevereiro, o nosso DEMoníaco prefeito decretou estado de calamidade pública em alguns bairros da Zona Leste de Sampa. Esses bairros estão embaixo da água desde DEZEMBRO!!! E só agora a prefeitura se deu conta de que essa é uma situação de calamidade pública!!! O homem cortou dinheiro para limpeza da cidade, cortou dinheiro de recapeamento, cortou dinheiro para limpeza de córregos, enfim, o DEMoníaco cortou tudo, menos o aumento de salário proposto pelos prezados vereaDORES para ele e os próprios parlamentares municipais...

Adendo 2 - Essa obra da Marginal é uma das coisas mais estúpidas que eu já vi em Sampa e não precisa ser gênio para ver os problemas. Os trechos onde as faixas novas foram inaguradas continuam entupidos como antes. Quem anda na Marginal não percebeu diferença nenhuma até agora, apesar de vários trechos com as faixas novas estarem liberados. Aumentou, sim, a chance de ocorrer pequenos acidentes, porque as faixas extras terminam sem nennhum aviso para o motorista. Ele vem de uma pista larga, com quatro, cinco faixas, e cai numa estreita, com quatro, três, disputando o espaço entre as faixas com as motos e empurrando ou sendo empurrado por quem vem na faixa do lado. Aposto que aumenta o número de acidente envolvendo motos com essa merda. Não dou dois anos para isso acontecer.

As pistas novas aumentaram a impermeabilização na várzea que é a margem do Tietê e onde estão as marginais. Portanto, a água da chuva vai ficar retida no asfalto por mais tempo e vai aumentar o problema de enchente. O governo tucANUS anterior pegou empréstimo no Banco Mundial ou no Interamericano para fazer a obra de aumento da calha do Tietê e de reforma nas margens do rio para amenizar o problema - enchente ali nunca será problema resolvido, porque várzea é isso mesmo, área de alagamento. O problema ali está na construção das marginais, pelo que sei, feita na gestão de um engenheiro (Maluf que fez, Maluf que rouba mas faz).

Mais de R$ 1 bilhão de dinheiro gasto nessa obra da calha do Tietê pelos tucANUS. Outro R$ 1 bilhão para a tal ampliação das faixas. Essa última obra praticamente anula os efeitos da obra anterior. Ou seja, o governo se endividou para nada, no fim das contas. E, para completar, pegou um dinheiro que podia ser colocado na continuidade da ampliação do metrô, um transporte público, para uma obra que supostamente melhora as vias pavimentadas e incentiva as pessoas a usarem carro, que é transporte privado. Por isso as montadoras amam o Brasil! Por isso não voto em tucANUS nem em DEMoníacos.

Aliás, também não voto em PT (Perda Total do meu voto...) Que foi o licenciamento da Belo Monte???? Caracoles!!! Todo mundo discutindo como manter floresta em pé para não aumentar emissão de carbono, metano etc, e o governo aprova licença ambiental para derrubar Amazônia e construir usina hidrelétrica lá na PQP. Me diga, onde se consome mais energia no Brasil? Centro-Sul. Qual o custo e quanto mais de floresta vamos derrubar para fazer a ligação da Belo Monte com o resto do sistema, de modo a essa energia chegar onde ela é mais consumida?

E por que, diabos, a gente não usa a energia gerada nas usinas de açúcar e etanol, que está aí, é só investir na rede de transmissão e propor boas regras para usineiros e distribuídoras? E a energia solar? E a éolica? Pelo amor dos meus filhinhos, é só olhar a China, vejam o que os camaradas estão fazendo lá. Já estão liderando a produção de energia eólica, os espertos chineses. E a gente aqui, criando um lago enorme que vai produzir metano (a vegetação embaixo da água começa a apodrecer e o reservatório de uma hidrelétrica fica anos emitindo metano, que é um gás estufa), derrubando árvores que estariam mantendo o saldo de carbono estável, desalojando pessoas e tudo o mais!

Cadê os protestos dos europeus e norte-americanos, que falam toda hora da cana avançar na Amazônia para não comprarem nosso etanol? Cana na Amazônia, com aquela insolação, produz pouca sacarose, de onde se extrai o açúcar e o etanol. Por conta de pegar muito sol, ela tem florada no Norte-Nordeste, tempo em que consome mais açúcar do que produz. Por ter muita radiação solar, a cana usa muita sacarose para crescer, lá chove muito e a água lava a sacarose, o solo é ruim, enfim, não é lucrativo plantar cana na Amazônia. Cadê o Michael Jackson, que até depois de morto fica falando da preocupação com a floresta, como ocorreu no Grammy???!!! Cadê as ONGs? Os ambientalistas (os de verdade, não o Minc, dá até vergonha ser geógrafa num dia assim)???!!! Um A-B-S-U-R-D-O!!!!

Welcome to the Jungle!!!

Embalada que estou para o show do Guns (uhhhuuuuuuuuuuuuuuu!!!!), a trilha sonora de hoje foi exatamente a música-título desse post. Eu levantei 6h da manhã. Odeio levantar cedo. Precisava chegar no trabalho às 9h. Fui para o ponto às 7h20. Depois de passar quase 10 ônibus e vans, todos lotados, imaginei que o metrô estaria inviável. Mesmo que eu conseguisse um espaço na porta de um dos ônibus que passam perto de casa, ficaria entalada no metrô. Ou seja, transporte público, só para quem pode fazer horário alternativo de trabalho, fugindo do horário de pico. Ou então, trate de se transformar em sardinha e fique feliz na sua lata. Algo que eu não tenho mais paciência nem idade para enfrentar. Se é para demorar, que seja confortavelmente sentada, e não esmagada na porta de um ônibus ou de um metrô por 1h30.

Então, voltei pra casa pra pegar meu carro, algo que tenho tentado deixar ao máximo na garagem porque o trânsito aqui simplesmente é impossível. Já eram 7h40. Adivinha? Cheguei 9h15 no escritório. O cara com quem eu tinha de falar por telefone às 9h já não estava atendendo o celular. Atendeu ligação às 10h e disse que estava em reunião. Ou seja, por que essa mula marcou para eu ligar para ele às 9h, sobre um assunto que é complicado, se 15 minutos depois já estaria ocupado??? Não entendi até agora. O fato é que eu podia ter chegado aqui às 10h30, horário em que tinha de fazer outra ligação para falar com outra pessoa. Horário que dá para pegar ônibus e metrô como gente e não gado confinado em caminhão a caminho do matadouro. Não precisava ter vindo de carro e, principalmente, não precisava acordar de madrugada.

A demora toda no trânsito se deu porque os putos dos políticos daqui resolveram transformar São Paulo em um imenso campo de obras. Tudo por causa desta merda de eleição. Os excelentíssimos tucANUS e DEMoníaco (cujos chefes aqui disputam pau-a-pau a minha profunda, eterna, devotada e sincera antipatia eterna) estão em campanha (Lulalá também, quase toda obra grande aqui tem dinheiro federal no meio), e as obras estão aceleradas porque tem data limite para inaugurar. É um tal de fecha avenida aqui e ali para obra, sem critério de dia, horário, sem ligar se aquilo vai fazer meia São Paulo parar... Uma insanidade!

Bem, São Paulo já é o inferno na terra. Infelizmente, em minha área de trabalho, não tenho muita alternativa, só tem emprego nesse setor nas grandes capitais. No interior não tem lugar para trabalhar. Se tivesse, eu caía fora daqui, toparia ganhar menos para ganhar em qualidade de vida. Mas não é uma opção hoje para mim, infelizmente.

Os políticos daqui resolveram transformar o inferno em algo tão pior que não tenho como definir. Hoje, a alça de acesso para a Marginal estava fechada, mas tem uma alça auxiliar, que passa no meio de uma favela, totalmente demolida pela dupla dinâmica tucanus-demônio por conta da malfadada obra de ampliação das pistas do Tietê. Os pobres pé-rapados da favela foram removidos sabe lá Deus para onde e no lugar, além do lixo e entulho que, claro, vão para no rio Tietê todo dia porque chove todo dia nesse lugar, tem uma imensa placa dizendo que serão construídas moradias para 1.500 famílias.

Pois é: hoje, além de obra pra todo lado, temos placas. Cadê a lei Cidade Limpa, hein, prefeito???? Eu procuro pelas lojas nas grandes avenidas e tenho dificuldade para encontrá-las porque o senhor mandou que as placas fossem de tamanho tal que só em construção grande aparece. A gente fica andando devagar na beira da rua, procurando os locais, que antes dava para ver de longe. Atrapalhando o fluxo, seja de carro ou de pedestre. Mas as placas que vão garantir a manutenção dos senhores no comando do pai Estado estão por toda a parte. Não tem obra nenhuma, ninguém trabalhando, um mísero peão carpindo o terreno, mas as placas estão lá. Um tremendo pega-trouxa, porque é o tipo de recurso que ainda ajuda as pessoas a votarem nessa cambada.

Voltando ao assunto da alça do Tietê... a alça secundária estava lá, entupida de carro. E, pra ajudar mais ainda o paulistano, para chegar nessa alça a gente tem de ficar nas três faixas do lado direito, das seis disponíveis no trecho. As outras três, do lado esquerdo, jogam a gente para o acesso à Fernão Dias/Dutra. E o que acontece nas três faixas do lado direito??? Ahhhhhh, acontece uma enchente. É, além do Jardim Pantanal, ali também está constantemente alagado. Só que agora a água avançou até metade da pista e a gente tem de ir pra esquerda, como se fosse para a Fernão Dias, para depois ir para a direita, contornando assim a água podre ali parada.

E o pior é saber que esses políticos incompetentes - nem falarei das coisas relacionadas a corrupção - vão se eleger. Isso é que é duro nesse país.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Capitão Rodrigo

Nelson Rodrigues dizia que toda unanimidade é burra. Já concordei com isso. Hoje não. Por exemplo: não tem nada de burro na unanimidade de se reconhecer que Machado de Assis é grande. Muitos citam como seu escritor favorito. Sem dúvida, é um dos meus heróis. Mas eu tenho de me render ao fato de que meu escritor favorito é Érico Veríssimo, apesar de eu ter lido muito menos coisa do Érico do que do Machado. Não tem como uma pessoa ler mais de 15 vezes o mesmo livro de um autor, no caso, Olhai os Lírios do Campo, e achar que gosta de outro. Ou ler todos os livros da série "O Tempo e o Vento" e ficar pensando dias e dias no Capitão Rodrigo, ou querendo ser Ana Terra, e pensar que Machado é o favorito.

Eu comprei a versão compacta da série O Tempo e o Vento em DVD, que foi ao ar na Globo em 1985. Meu irmão gravou a série em VHS para mim, na época. Mas eu precisei de fitas para gravar a corrida do Ayrton no Brasil em 1991 - pois fui ao autódromo e na pista a gente não vê toda a corrida. Meu pai, que tinha e tem umas sovinices que eu não entendo, ao invés de me dar uma fita VHS nova, mandou eu me virar. E eu apaguei uma parte de O Tempo e O Vento. Detalhe: meu pai deve ter até hoje fitas VHS virgens, sem uso... Vai entender.

O Tempo e o Vento é uma obra curiosa. Ao mesmo tempo que tem a marca regional, retratando a formação do Rio Grande do Sul, fala de temas universais, que podemos entender mesmo vivendo na China. Mas não vou fazer aqui uma análise literária, porque sou incompente para isso. O que eu realmente queria era declarar meu amor ao Capitão Rodrigo.

Eu comecei, de uns anos para cá, a admirar personagens que não são nada, nada politicamente corretas. Eu sempre fui CDF e sempre fui certinha. A chata da turma. Aquela que não joga lixo no chão, que não cabula aula, que não desobedece pai e mãe, que se preocupar em não prejudicar o outro, que leva a sério o ditado que diz "onde termina seu espaço começa o meu" ou " não faça com os outros o que não quer que façam com você." Sendo assim, admirava pessoas que agiam sempre de maneira correta. E meus heróis nos livros eram os mocinhos.

Havia exceção. Uma delas era minha admiração pelo Capitão. Eu sempre oscilei entre ser boa menina e uma garota levada. Sempre me comportei bem, por medo de ser rejeitada por pais, irmão, tios, tias, primos etc. Só que eu sempre quis fazer o oposto. Quando me diziam para não começar a namorar durante o ginásio e o colegial, porque atrapalharia meus estudos, eu pensava que devia fazer o oposto. Quando me falavam pra não fumar e não beber, eu achava que devia experimentar. Quando me diziam que eu não podia cabular aula e eu via as meninas descoladas da escola indo pra Romero no Pilequinho, eu pensava no quão chata era minha vida. Eu era fã de Madonna, e de repente larguei a diva pop e fui ser fã de Ayrton Senna - mais politicamente correto impossível.

Contudo, no geral, mais por medo e menos por convicção de que era aquele o meu caminho, a boa menina venceu todas as batalhas e a substituição de Madonna por Ayrton foi muito simbólica nessa luta entre a boa e a má menina, entre a garota que quer ser discreta e aquela leonina típica que eu deveria ser, aquela que chega chegando e que todo mundo vê e presta atenção, que todos podem amar ou odiar, mas nunca ficar indiferente.

Quando eu entrei no primeiro ano da escola, no primário, eu tinha dois namoradinhos. Dois. Não era só um. Eram dois. E eles brigavam por mim. Um deles me seguia de bicicleta, me escrevia cartas, era romântico incurável. Eu era assim aos seis anos. Chamava a atenção a ponto de ter dois namorados. Até agora eu não sei onde essa menina foi parar. Acho que me perdi dela entre as humilhações na rua de casa e as que ouvi da minha própria família, que deve ter, de forma inconsciente talvez, agido para minar meu potencial de ser essa menina, pois ela daria muito trabalho e que família quer ter trabalho, né?

Até hoje, eu percebo que a menina má está sempre rondando, esperando que a boa dê uma chance para ela mostrar as garras. Ela quer surgir usando roupas provocantes, bijus douradas, maquiagens e saltos, quer chegar e ser notada, quer ter coragem para dizer "amem ou me odeiem, mas falem de mim" e ser feliz com isso, sabendo que críticas virão e que ela vai suportar todas sem ligar. Quer pegar todos os caras que achar que vale a pena, encher a cara sem culpa, se acabar de dançar na pista e se acharem que ela é piranha por isso, foda-se. E é essa má menina que gosta dos bad boys a la Capitão Rodrigo.

Agora, tendo vivido metade da minha vida, começo a admirar ainda mais os que erram. Os que arriscam e erram e levantam, sacodem a poeira e erram de novo. E continuam sendo amados e admirados por isso. O Capitão Rodrigo de Veríssimo era assim: não gostava de trabalhar, só de lutar, guerrear. Não era fiel, não gostava da ideia do casamento, era péssimo pai (a filha recém-nascida morre e ele está jogando carteado e enchendo o caneco), era ateu, não respeitava nem o padre, que era seu amigo. Mas ninguém lhe era indiferente. Mesmo sendo assim, teve o amor incondicional de Bibiana e amizades verdadeiras, como a do cunhado Juvenal, que mesmo vendo o camarada pisar na bola com a irmã, não arrefeceu em sua amizade um centímetro que fosse.

Capitão Rodrigo era um bravo. Tinha coragem e sustentava toda sua petulância e orgulho. Não tinha medo. Era um destemido. E era justo. Queria dividir as terras dos estancieiros entre pobres e negros. Era a favor da abolição e de que se tratasse gente como gente. No exército, era um dos melhores que existia, condecorado. Mesmo quando tentava fazer as coisas direito, era incompreendido, como quando tentou chamar Bibiana para a dança e o Amaral não deixou, provocando um duelo que terminou em deslealdade, com o Capitão baleado em uma luta que seria apenas com punhal.

Momento vergonhoso, mas enfim, é parte da minha vida... Me lembro que o "primeiro amor da minha vida", em termos fictícios, foi o personagem do Erick Strada em Chips. Outro foi o Robby, do Menudo. E depois veio a paixão fulminante e definitiva por Patrick Swayze, ao ver o clip da música-tema de Dirty Dancing. Aí tive o Ayrton e esse continua sendo o líder. Todos bons meninos, certo? Tá, o personagem do Chips era mulherengo, mas ele saía com uma mulher de cada vez... Era honesto.

Não me lembro de ter me apaixonado por nenhum personagem de livro, apesar de ler demais da conta. Contudo, entre o Robby e o Patrick, eu li parte da obra O Tempo e o Vento e fui apresentada ao Capitão Rodrigo. Que depois foi personificado por Tarcísio Meira na televisão e eu tenho a mais absoluta certeza de que ninguém conseguiria fazer um Capitão Rodrigo tão igual ao Capitão criado por Veríssimo do que o Tarcísio. Para mim, foi o melhor papel que o Tarcísio fez em toda sua carreira. Não tem outro Capitão Rodrigo que não seja o Tarcísio. Igual Conan: só o Arnold pode fazer. Igual Corleonne, só o Brando pode ser O Padrinho.

O que gosto em personagens assim como o Capitão é exatamente isso: não são bons nem maus. São humanos. Mesmo que fictícios, são humanos. Não são heróis por serem sempre bonzinhos. Não são vilões porque só praticam a maldade. São seres admiráveis. Não são personalidades planas e fáceis de se entender. Não são personagens que você apenas ama ou odeia, mas que te leva a amar e a odiar de uma cena para outra. Adoro encontrar esses personagens complexos. O que me lembra Marlon Brando em Um Bonde Chamado Desejo, que é outro personagem que me levaria a escrever um post.. em outro momento.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

As aulas que não tive

Durante minha vida, não formulei planos que envolvessem qualquer tipo de relacionamento humano. Namoro, casamento, amizades, nada disso esteve ou está nos meus planos. Eu cresci ouvindo muitas coisas, como toda criança. Ouvi muitos nãos. Ouvi muitas críticas. Ouvi poucos elogios. A maioria deles acompanhado de um “na verdade, era sua obrigação ir bem”. Cresci em uma família que estimulava o menino que eu gostava a ficar com minha prima bonita de Minas. Eles eram o casal perfeito: ele muito inteligente e ela muito linda. Quando ele começou a gostar de mim e fez menção de me pedir em namoro para os meus pais, foi proibido de fazê-lo. Muitas fofocas rolaram e ele foi embora. E eu aprendi que meninas bonitas ficam com meninos bonitos e inteligentes.

Meninas como eu não fazem nada a não ser estudar, porque ninguém se interessa por meninas como eu. E quando se interessam, estão atrapalhando os grandes planos que fizeram para essa menina e que não incluem um rapaz do lado. Na verdade, os plano não incluíam ninguém, porque qualquer um seria distração para atingir o objetivo de fazer a menina construir seu futuro, que era estudar e ter profissão para poder se sustentar. Porque para mim não viam muito futuro: ou não ia me casar porque ninguém ia me querer, ou ia casar, mas ia me separar, porque sou insuportável e o cara ia acabar saindo com outras e tals. De forma que eu precisava me manter sozinha.

E depois desse primeiro menino, veio o grande amor da minha vida, aquele que nunca se apaga. Mas ele não se lembrava de mim na escola, a frase perfeita para me definir. Fato é que minha mãe sempre me dizia que eu me achava a rainha da Inglaterra, quando eu voltava da rua chorando por alguma humilhação sofrida no meio das crianças dos vizinhos. Minha mãe dizia que eu achava que elas estavam falando de mim, mas não estavam, porque eu não era tão importante assim. Que ninguém me notava, na verdade, eu que era paranóica. E que eu ia acabar sozinha porque eu não conseguia fazer amigos. Até hoje eu choro quando eu escuto a voz da minha mãe me dizendo essas coisas...

Bem, se você ouve da pessoa que supostamente mais deveria te amar nesse mundo que você não é importante e que as pessoas não falam de você porque você simplesmente não existe para elas, fica difícil você achar que existe para alguém. Cresci assim. Querendo não existir. Querendo não ser notada. Querendo que as coisas acabassem logo. E não foi surpresa ouvir que não se lembrava de mim na escola. Aliás, foi o que de menos cruel eu já ouvi de pessoas de quem eu gostei de verdade. Ele podia ter aproveitado que eu gostava tanto dele para me fazer de boba. Me humilhar. Se divertir às minhas custas. Mas não, ele não foi cruel comigo como tantas vezes haviam sido. Ele simplesmente disse que não se lembrava de mim e cada um foi para o seu lado.

Apesar de eu ter ficado triste e achado desnecessário ele falar aquilo, também fiquei aliviada por ver que ele não iria me submeter a uma humilhação pública e inesquecível só porque achava divertido ver alguém sendo humilhado. Ele era assim, falava o que pensava e resolvia tudo, não deixava nada pendente. E uma vez resolvido, ele deixava para trás. Talvez ele tenha ganhado meu respeito por ter sido a primeira pessoa que não gostava de mim, mas que me tratou como gente. Não xingou, não humilhou, não se aproveitou... Só disse uma frase e encerrou a conversa. Para sempre.

Tenho consciência de que o dito pela minha mãe não é verdade. Hoje sou adulta e posso até me defender melhor das coisas. Mas o fato é que eu cresci assim, sendo um nada. Afundei nos estudos e me relaciono bem com livros, mas não com pessoas. Sou um desastre com pessoas. Nunca sei o que dizer ou o que fazer. Porque eu não era importante, então eu não me relacionei com muita gente e evitei muito tipo de experiência para não sentir a mesma dor de quando criança. E hoje a mesma família que me criou para ser o que sou hoje, bem-sucedida em termos profissionais e financeiros, capaz de me manter sozinha, me deseja um grande amor de presente de natal e de ano novo. Parece que querem que eu faça uma operação de raiz quadrada quando eu sequer aprendi a somar direito. Todo mundo se incomoda com minha solidão. Todo mundo fica falando que eu preciso “encontrar um amor”, como se eu quisesse isso ou soubesse como arrumar algo assim.

Na verdade, minha tristeza é saber que eu não sei amar porque eu pulei as etapas, porque eu não aprendi a somar, subtrair, multiplicar e dividir, pra depois passar para operações mais complexas como a raiz quadrada. Daí eu voltar no tempo para saber o que aconteceu de verdade em 1990. Porque com ele eu tive a única e última oportunidade de começar a aprender a amar. Depois dele, eu fui tentando fazer divisão sem saber multiplicar e as contas terminaram todas erradas. Tem coisas que precisam ser vividas para serem aprendidas e para a gente levar para frente. Eu não tive essa oportunidade. Quando ele disse que não se lembrava de mim na escola, e depois ele foi embora daqui para sempre, eu entendi que aqueles eram sinais de que eu não vim para essa vida para aprender a amar. Eu vim para aprender muitas coisas, mas amar não era uma delas.

Tanto não sei amar que perdi um primo muito querido no começo de dezembro. Chorei, fiquei triste, mas muito mais pela dor das outras pessoas - filhos, a mãe dele, as irmãs - do que por sentir algum amor por ele. Acho que eu não amo ninguém, no final das contas. Não sei como fazer isso, amar as pessoas, seja homens, seja parentes, amigos, seja quem for. Fugi de todas as aulas. E quando não fugi, minha família ou a vida fez o favor de tirar a sala de aula ou o professor do meu caminho. Não tem coisa mais triste nesse mundo do que um ser humano que não sabe amar e não ama...