quinta-feira, 2 de julho de 2009

Elvis



Sou fã do Elvis Presley. Da fase romântica, que é o final da carreira dele. Amo os shows de 70. Amo o especial de 68. Para mim, Deus conseguiu, uma única vez, criar um ser absolutamente perfeito, o protótipo do deus grego que a gente pensa ser o ideal de beleza masculina. E ele criou dois deles, de uma vez. Porque Elvis tinha um irmão gêmeo, Jesse. Que morreu no nascimento, infelizmente, o que marcaria para sempre Elvis. Entre as muitas dúvidas existenciais de Elvis, uma era constante: por que não tinha sido ele a morrer, mas o irmão? E sua mãe estabeleceu uma forma de criar Elvis que era protetora por demais, e apegada por demais. O que é natural e compreensível, dado o trauma de perder o outro filho.

Por que estou falando de Elvis? Por causa de Michael Jackson. A bem dizer, MJ é o Elvis da minha geração, não no sentido de ser bom, pior ou melhor do que Elvis, mas de alguém que revolucionou a música da sua época. Elvis inventou o rock, dizem. Eu acho que o mérito dele não foi inventar o rock, mas lançar as bases do que seria a moderna carreira de um artista. Produtos com sua marca, shows por temporada, filmes, gerar e alimentar a histeria de fãs etc, coisa que só se aprofundou com sua morte. MJ seguiu a cartilha, mas a aprimorou, contando com maior apoio da mídia, em especial no que diz respeito a seus videoclipes, onde vimos as danças e roupas maravilhosas.

Ninguém é Elvis ou Michael do nada. Não tem marketing que sustente fenômenos assim por tanto tempo se eles não tiverem uma carga extra de talento, um diferencial de todo o resto. Marketing ajuda. Quem é muito bom, sem marketing, não vai a lugar algum. Quem é muito ruim, com marketing, pode se sustentar um tempo. Mas cai no esquecimento, na vala-comum dos mortais. Essa é minha teoria.

Hoje, fãs se digladiam para provar que Elvis era melhor que Michael. Que Beatles era melhor que Elvis... Bobagem... Gosto não se discute. Gosto de Beatles, mas meu coração bate forte quando ouço Elvis. Como é que vou achar Beatles melhor? Elvis fazendo improvisos nos ensaios dos shows, ou cantando ao vivo... parece que ele não faz a menor força para nada. Nunca. A voz sai, as risadas saem, as piadas saem, os olhares maliciosos saem, os sorrisos tímidos e brincalhões saem... tudo assim, natural, normal. O que me espanta em Elvis é essa naturalidade, essa impressão de que está tudo ali e ele nem vê. Ele vai usando... a voz, o corpo, os gestos, olhares, tudo. E sem pensar, sem ter consciência de nada.

Claro que há similaridades nas mortes de Elvis e Michael. Ambos foram pessoas infelizes. Tinham momentos de felicidade, mas parece que se colocarem na balança, verão que os de infelicidade predominaram em suas vidas. O problema dessas pessoas, me parece, é o excesso de criatividade que os faz ser bem-sucedidos em quase todas as ideias novas, que viram grande sucesso de maneira quase imediata. Elas são aprisionadas naquele universo dos negócios da música exatamente por serem extremamente criativos e bem-sucedidos em suas novas propostas. E, como pessoas criativas em extremo, não conseguem dar vazão a isso depois que são amarradas pelo sucesso do que estão fazendo.

Elvis teve muitos problemas para se reinventar, para deixar de ser o moço que rebola, canta como negro, que empolgava as moças, e mudar, assumir que era um coroa que atingiu o ápice na qualidade da voz, e tinha de crescer junto com seus fãs. Todo artista que começa jovem se depara com o dilema de ver seus fãs crescerem. Perderem público. Perderem venda de disco ou CD ou público de filme. Aí entra a máquina de moer gente da indústria do show business.

Elvis foi massacrado por ela. Não quero dizer que ele não tenha tido responsabilidade sobre isso. Mas as pessoas precisam entender que pessoas como Elvis e Michael não é gente para se preocupar com coisas mundanas. Eles vivem em outro plano. Essa mente criativa deles não permite que eles vivam na Terra e pensem em dinheiro ou em comer ou em casar... O problema de gente como eles é que, muitos, cabeça na lua que são, precisam de ajuda em todos os níveis da suas vidas, mas infelizmente acabam sendo mal assessorados.

A família e os amigos, além do exploradores e falsos de plantão, sempre estão por perto. E elas percebem alguns dos absurdos que pessoas como Elvis e Michael cometem. Mas, de início, elas preferem convenientemente não falar nada, não criticar, não botar limite. Porque elas querem manter o privilégio de ser próximo de pessoas como Elvis e Michael. De usufruir da fama. Do dinheiro. Das mordomias. E esses caras vão fazendo coisas cada vez mais malucas, para dar vazão a criatividade, presa no cotidiano de "vamos continuar a fazer o que estamos fazendo porque dá certo e dá dinheiro". Quando assessores e familiares dão por si, já é tarde demais. Eles estão incontroláveis e perderam totalmente o senso de realidade.

E eles perdem o senso de realidade cada vez mais rápido quanto mais são tolidos em sua criatividade, em seus planos para dar vazão ao que criam ou ao que gostariam de experimentar. Não posso falar por Michael, porque eu não sei quase nada da carreira dele. Mas do Elvis eu sei um pouco. Com ele a máquina foi implacável. E atendia pelo nome de Coronel Parker.

Elvis começou aos 19 como cantor. Era totalmente excêntrico e fora de qualquer padrão vigente em sua época. Seu sonho passou a ser fazer filmes. Mas ele tinha um desejo honesto de ser ator importante, profissional. Ele queria ser um Marlon Brandon. Queria papéis sérios. E ele tinha potencial para fazê-los, é só conferir nos filmes que não são água com açúcar. Mas ele começou modestamente, com papéis mais simples. Porque Parker viu a mina de ouro que seria colocar o menino para cantar nas telonas. Para Elvis, o lance era aprender a atuar. Para Parker, o lance era ele continuar cantando, mas em outra mídia. E faturando. Alto. Muito alto.

E o que era uma oportunidade para Elvis, filmes em que ele podia ir aprendendo a ser ator até conseguir um papel importante e mostrar seu valor, virou uma rotina de filmes melados, em que, do nada, ele saía cantando ou socando alguém em busca da mocinha do filme. O primeiro, o terceiro filmes... tudo bem. Mas virou rotina. E toda rotina é o oposto da criatividade. E assim a máquina, que não mexe em time que está ganhando, ia moendo Elvis e sua criatividade, enquanto Parker via Elvis torrar o dinheiro que ganhava, sem fazer nada para cortar esse círculo. E por que Parker cortaria? Se o fizesse, Elvis seria menos dependente dele, porque ele não precisaria fazer tanto dinheiro, não é verdade?

Finalmente os tais filmes começaram a não dar tanto dinheiro e Elvis atingiu o limite do chamado "saco cheio". Aí veio a retomada da carreira de cantor. Anos sem fazer shows, só nas telonas, e fazendo musiquinhas meladas. Mas ele quer cantar ao vivo. Vem o especial Come Back de 68, uma das coisas mais deliciosas que eu já assisti na vida. Ele está mais lindo do que nunca, e a voz mais perfeita do que nunca. Com esse sucesso, a ideia de fazer temporadas de shows. E de 1969 até morrer, Elvis e sua criatividade novamente são massacrados pela rotina imposta pela máquina que precisa gerar dinheiro. Algo que serviu para liberar sua criatividade, os shows duraram anos e anos. E lá estava Elvis preso à rotina novamente.

Ele saiu da ditadura da rotina dos filmes para a ditadura da rotina dos shows. Preso no círculo ganhar-gastar dinheiro, porque pessoas como ele não pensam nesse mundo prático, a cabeça delas sempre está em outro lugar. Ele foi até onde deu. E terminou intoxicado de remédio. Pra dormir, pra acordar, pra comer, pra parar de comer, Elvis tinha um remédio pra cada uma das coisas que precisava fazer, praticamente... Terminou sozinho, sufocado no tapete de seu banheiro, onde caiu de rosto e de onde nunca mais se levantou.

Um comentário:

Fernanda Medeiros disse...

Olá, sou eu outra vez, invadindo o seu blog, deixando as minhas notas.

Outro dia estava vendo um documentario sobre a vida de Elvis.
Antes, o via como um mito.
Mas agora, eu ja o vejo de uma maneira diferente...

Simpatizo mais com Elvis, pq ele nao teve esse lado escuro do MJ.
Ele prejudicou a ele mesmo (tirando a familia e os fas...), mas ao deixar esse planeta, deixou td a familia bem e mudou a historia da música.

E sabe o que mais me chamou a atencao de td o que eu ouvi sobre o cara?
Que ele nao fazia distincao de racas. Ele se misturava com outras racas e foi dai que tirou aquela maneira particular de dancar.
O que aconteceu naquele momento, era que o mercado procurava uma pessoa branca para cantar musica negra (essa era a sociedade). Antes, o blues era proibido nas radios. Havia mto racismo e Elvis foi um cara que mudou isso.
E convivia com essas pessoas.

Essa foi a parte da personalidade desse cara que me comoveu.

Mas... o documentario foi interrompido por uma ligacao de uma amiga.

Adeus Elvis.