O padre Tarcísio quase sempre cita a questão da simplicidade em seus sermões na missa que eu sempre vou aos domingos, no lindo Santuário de Santa Isabel. Gosto muitíssimo dos sermões dele, tanto que tem uma igreja na minha rua, mas eu prefiro pegar o carro e ir até a Santa Isabel para ouvi-lo. Eu sou de família católica, fiz comunhão, mas me afastei da religião completamente em 1989, depois do acidente. E a mesma pessoa que me levou para longe da religião, agora, me fez voltar a ela, em busca de um pouco de paz de espírito e equilíbrio. Está funcionando. Tem sido importante ouvir o padre Tarcísio.
Mas tudo isso era para falar desses casos de pais e mães que esquecem os filhos dentro dos carros e perdem as crianças. Essa semana tivemos mais um caso de uma mãe que deixou sua bebê dentro do carro. Ela tinha claro que havia deixado a menina na escolinha, mas não fez isso. Todo mundo se pergunta o que faz uma pessoa que sempre se mostrou responsável, que não estava bêbada ou drogada, esquecer seu filho trancado no carro, em um calorão horrível, e não se lembrar. Depois a pessoa chega no carro e dá de cara com o filho morto, desidratado pelo calor. Não há pena de prisão necessária para esses pais. Vão se martirizar pelo resto da vida. Casamentos acabam, famílias, se desmancham. Tudo desmorona.
Bem, acho que essas coisas acontecem porque não seguimos os conselhos de padre Tarcísio sobre a simplicidade. Nossas vidas nessas cidades gigantes, tão corridas, tão cheias de pressão, de responsabilidades, de regras, de horários, de obrigações. Tão vazias de sentimentos, de humanidade, de educação, de gentileza, de simpatia, de cooperação, de olhar o próximo, tão violentas e cheias de desconfiança. A gente liga o piloto automático, fazendo todo dia a mesma coisa, tudo sempre igual. Igual a música de Chico: "todo dia ela faz tudo sempre igual, me sacode às três horas da manhã, me sorri um sorriso pontual..."
Até mesmo para se divertir as coisas são complexas, e quase tudo depende do dinheiro, que, no final das contas, é o que nos leva a levar a vida de autômato nessas cidades em que se compete por tudo: espaço no ônibus, no metrô, na fila do banco, na fila do restaurante, no trânsito. Todos precisam chegar logo nos lugares para serem eficientes e ganharem dinheiro e continuarem tendo espaço para mostrar sua eficiência. Estuda-se para melhorar na profissão.
Até a escolha do divertimento tem propósitos, muitas vezes, ligados a profissão: pessoas que frequentam determinado restaurante porque lá vão os executivos de seu interesse, assistem determinados filmes porque todos no trabalho falarão disso... Até relaxar vira obrigação, para que você seja uma pessoa equilibrada no trabalho. E para quase tudo hoje que se queira fazer é preciso ter dinheiro.
Para dar conta de tudo, fazemos as coisas sem notar. Ligamos o tal piloto automático, baixamos a cabeça e seguimos em frente. Todo robô vai falhar em algum momento. E alguém terá de corrigi-lo, porque ele sozinho não consegue. E nem sempre tem alguém do lado do robô para arrumar o que o robô deixou de fazer. Foi o que aconteceu com essa mãe. Se a vida fosse mais simples, talvez, ninguém precisasse ser robô nessa vida.
Eu gosto de fazer coisas que não seguem objetivo algum, não tem propósito ou utilidade. Gosto de dançar, mas não quero ser bailarina profissional. Gosto de estudar, mas não necessariamente aquilo que estudo tem utilidade para eu fazer dinheiro ou me promover. Estudo porque gosto e pronto. Se é útil, ótimo, se não é, ótimo também. Comecei a fazer isso porque realmente estava cansada de sempre fazer algo com algum objetivo maior. Enquanto estava envolvida nisso, deixava de ver outras coisas.
Ainda falta muito para que eu consiga levar uma vida mais simples. Mas eu não sou consumista, por exemplo, e isso é mais de 70% do caminho para a simplicidade que o padre Tarcísio prega. Ele sempre pergunta: quando pedimos algo, a gente avalia se realmente precisa daquilo? Eu sempre me faço essa pergunta. E não preciso de quase nada que eu quero, constatei. Isso reduziu a pressão que tinha em mim sobre ter de obter dinheiro. Porque correr atrás do dinheiro nos faz levar uma vida de loucos, de modo que a gente pode até esquecer o filho dentro do carro... Não, não quero nada disso pra mim.
sexta-feira, 20 de novembro de 2009
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