Dizem as más línguas que o Unibanco enviou para minha casa o termo de quitação da hipoteca. Desde o dia 14 a casa está paga. Tudo o que eles precisam fazer no banco é me dar uma carta dizendo que paguei minha dívida. Qual é a dificuldade? Eu não tive nenhuma em preencher as três vias que o Unibanco mandou para liberar meu FGTS junto à Caixa, ir ao cartório, reconhecer firma, enviar pelo correio, receber outra via para assinar porque o endereço da casa é um, e o endereço da casa no registro de imóveis é outro (!!!), ir novamente ao cartório reconhecer firma, ficar uma hora tentando imprimir no tamanho certo o boleto Unibanco para pagar o resíduo, ir na agência aqui perto do escritório e descobrir que só poderia pagar se fosse em cheque - os bancos desestimulam a gente a usar cheque, você pára de usar e aí eles pedem que você use - , ir na Paulista para poder pagar na agência onde tenho conta, ligar 20 vezes no Unibanco...
Tudo isso, senhores, para, na hora de dizer "Ok, a senhora pagou sua dívida", eles me explicarem gentilmente que o prazo para enviar o termo de quitação é de 45 dias ÚTEIS!!!! Sim, praticamente dois meses para o banco mandar uma carta dizendo que eu paguei minha dívida. Realmente, perto de toda a burocracia que eu enfrentei, a parte mais difícil deve ser essa... deve ser muito complicado pro banquinho Unibanco escrever e botar a tal cartinha no correio. Oh dó!
Mas não é só isso. O pulha que quer comprar minha casa invocou com o processo de anistia. OK, tá no direito dele. Fui ver a quantas andas o processo. Na subprefeitura, depois de mais de uma hora, o engenheiro me diz que o processo está na Secretaria de Habitação. Não sabe porque e tem a cara de pau de me dizer que euzinha tenho de ir até a Sehab, no centro, pra descobrir porque a Subprefeitura onde ele, engenheiro, trabalha não está com o meu processo. E euzinha é que tenho de dizer pra Secretaria que eles devem devolver meu processo para a Subprefeitura. Aí, sim, o zeloso e competente engenheiro-funcionário-público cujo salário é pago por mim e cuja função é trabalhar para me atender poderá me dizer a quantas andas o processo.
Dessa forma, euzinha dizendo pro governo municipal o que eles devem fazer - justamente euzinha que paga pra prefeitura fazer as coisas, sou obrigada fazer as coisas pela prefeitura - me encaminhei para a Sehab, mandando, em silêncio, claro, o digníssimo engenheiro tomar no meio do olho daquele orifício situado entre as nádegas. Lá fui euzinha pra Sehab, toda iludida, achando que estava chegando ao fim de túnel para encontrar a luz que responde a uma simples pergunta: a quantas anda hoje, em 2008, o processo de anistia que eu pedi em 2003, ou seja, há quase cinco anos???!!! A Sehab conseguiu me dar uma resposta mais surreal ainda.
No 24o andar da Sehab, para onde o engenheiro competente da subprefeitura me mandou, me atendeu uma moça com sotaque mineiro fortíssimo, bonitinha, solícita, simpática, e sozinha na sala enorme, em plena 10h da matina, período de pleno expediente. Digo a ela que estou lá para saber do meu processo. Senta que lá vem história!
Primeiro, ela explica que os processos, "que são muitos", foram todos para a Sehab porque a Secretaria de Finanças precisava fazer as contas de quanto de imposto sobre serviço (ISS) nós (que somos infratores do Código de Construção Civil e do Plano Diretor da cidade) teríamos de pagar pela regularização. OK, ok, entendi, fazer conta pra meter a mão no nosso bolso, afinal é ano eleitoral e o caixa de campanha precisa ser preenchido com dindim.
Segundo, a moça diz que agora que terminaram os cálculos, os processos estão sendo devolvidos "aos poucos porque são muitos" para o setor de origem, chamado Aprove. E eu, otimista que só: ah tá. Estão devolvendo para as subprefeituras, então. E ela, não, o Aprove fica ali mesmo na Sehab. E eu novamente vendo a luz no fim do túnel, pensando que era a saída, penso, OK, então vou ao Aprove...
Imaginem agora aquela cena de desenho animado, em que o personagem vira um pirulito e aparece a palavra idiota ou estúpido no lugar da cara do sujeito. Pois é, era eu, senhoras e senhores, a perfeita estúpida, naquele momento.
Ao virar pirulito, percebi que a luz no fim do túnel era, na verdade, um trem e pimba! Dei de cara com a máquina... A moça diz que nãaaaaaaaaaaaaao, que o processo está com ela, sim. E que eu poderia fazer uma cartinha a mão, de acordo com o modelo ali colado na parede, para que seu departamento agilizasse a entrega do meu processo para o tal do Aprove. O que demora uns cinco a sete dias, ÚTEIS, claro, e eu fico me perguntando o que é dia útil pra esse povo, porque parece que em órgão público é sempre feriado. Mas, estando o processo no departamento Aprove, eu posso pedir vista, ver o que falta, tirar xerox etc etc etc Eu, tentando me recuperar do choque com o trem e não vendo luz no fim do túnel, preenchi a tal cartinha e saí.
Agora, façamos as contas. Eu já paguei esse ISS que fez os processos irem pra Sehab - aliás, eu já tinha pago isso quando pedi pela anistia e paguei novamente. Eu recebi o carnê em agosto ou setembro do ano passado. Terminei de pagar em dezembro. Para eu ter recebido o carnê em meados de 2007, significa que os tais técnicos da Secretaria de Finanças fizeram as contas no primeiro semestre de 2007. Devem ter concluído isso em junho, julho o mais tardar, pros carnês chegarem para a gente em agosto ou setembro, certo?
Ou seja, de, vamos lá, agosto de 2007 até março de 2008 o meu processo para regularizar uma obra de pouco mais de 40 metros quadrados embaixo da minha própria casa está paradinho, esperando que a Sehab devolvesse-o para... a própria Sehab. Que o departamento chamado assessoria técnica da Sehab envie para o departamento Aprove da Sehab uma pastinha com uma planta básica de um galpão de 40 metros e poucos quadrados de área.
Detalhe: a assessoria técnica fica no, como disse, 24o andar do famoso Edifício Martinelli, no centro de São Paulo. E o Aprove, sabe onde fica? Longe, longe... No 21o andar! Isso mesmo, prezado leitor!!! Meu processo de anistia está desde agosto de 2007 esperando para descer três andares de escada. Aliás, de elevador, porque lá tem elevador, o sujeito que tiver de descer a pastinha não terá nem a canseira de descer/subir degrau. E a pasta só vai descer porque eu fui lá pedir, viu? Do contrário, continuaria lá, deitada em berço esplêndido como o Brasil. E tudo isso sabe para quê? Para eu pagar IPTU, senhores. Sim, porque o interesse em regularizar essas construções é todo da prefeitura, por mim aquilo podia ficar como estava.
Na maior cidade do país, uma simples pasta demora nove meses para descer três andares. Nove meses é o tempo para se gerar uma vida. Mas deve ser mais complexo descer uma pasta do 24o para o 21o andar do que gerar um bebê, certo?
E ainda tem gente que acha que um país assim pode dar certo. Tsc tsc tsc...
sexta-feira, 28 de março de 2008
terça-feira, 25 de março de 2008
Dupla do barulho: Aedes aegypti e Andréia Schwartz
Não dá mesmo pra ter fé nesse País. Aqui, crescemos 5% ao ano, achamos isso o máximo, ainda esperando o bolo crescer para reparti-lo, como se isso fosse algo realmente possível depois de 500 anos e tralalá de existência. Mas tudo bem, "nunca antes nesse país" fomos tão bem, apesar de termos um Rio de Janeiro apovorado com a dengue, uma crise nacional envolvendo a febre amarela... E no Maranhão, acreditem, temos, em pleno século XXI, casos de beribéri, doença provocada por um fundo que inibe absorção da vitamina B1 e pode causar problema cardíaco. Todas doenças tropicais, todas doenças de gente pobre, todas doenças de país que não cuida do seu povo.
O mais lamentável é que doenças que já deveriam ter sido erradicadas há séculos estão ainda assustando pessoas que moram em capitais. Não, não estou falando de uma cidadezinha no interior do Sergipe, daquelas que, se você passar em quinta marcha, atravessa a cidade e não a vê. Estou falando da capital do Rio de Janeiro, da porta de entrada de boa parte dos turistas que vêm ao Brasil, da antiga capital brasileira, de uma das maiores cidades do País.
E para piorar mais o quadro, os nossos amigos políticos, pessoas conscientes que são, dotados de inteligência ímpar, agora empurram para saber de quem é a culpa. Na Globo hoje cedo, lembraram que, primeiro, o presidente Lula havia dito que o mosquito da dengue era federal. Agora, os seus ministros estadualizaram o mosquito. E o Estado do Rio municipalizou o mosquito. E o município individualizou o mosquito.
No fim, ninguém tem razão, porque, na verdade, a culpa é de todos, governo federal, estadual e muncipais, e também dos cidadãos, que além de não saber votar, ficam achando que Deus protege a casa deles e que, na falta Dele, o Estado Pai o fará. A culpa vai do senhor Lula, que só falou e pouco fez, tanto que o SUS está aquela porcaria e não atende a demanda, ao morador da favela que não levou a sério os 20 mil anúncios que passam na propaganda da novela das 21h ou no Big Brother Brasil sobre não deixar água limpa em pneus, vasos, garrafas etc e que ele solenemente ignorou porque estava usando o celular pré-pago para votar em algum imbecil que estava no paredão da semana.
As "otoridades" também ficam discutindo se 50 mortes (algumas são suspeita de morte por dengue, não se sabe o número certo) é epidemia. E eu me pergunto: qual importância tem se morre uma pessoa ou 1.000 ou 1 milhão? Devemos agir assim que começam os primeiros casos, para não virar epidemia, não é isso que diz a lógica em saúde pública?
Enquanto os inteligentes discutem, as pessoas se desesperam nos postos médicos. E o governador do Rio vai inagurar um centro de hidratação. Achando que isso refresca alguma coisa. Deviam ter jogado uma torta na cara dele, que deixou de cumprir com suas obrigações e agora acha que merece aplauso por estar agindo. Tivesse agido antes, e não ia precisar ter centro de hidratação emergencial no seu Estado.
Mas tudo bem: o mais importante é que crescemos 5% e que a Andréia Schwartz, a prostituta que se envolveu no escândalo que derrubou o governador de Nova York Eliot Spitzer, voltou ao País e tinha trocentos mil jornalistas lá para entrevistá-la. Dizem que a Record pagou pela volta dela, na classe executiva, em troca de uma exclusiva. Dizem que ela só quer dar entrevista para quem pagar por isso. Dizem que ela ajudou nas investigações que derrubou o governador, mas não se sabe bem como.
Pelo que entendi até agora, estão dando importância demais para ela e de menos para o fato de que o governador de NY caiu não porque seu Estado registrou mortes de dengue, ou casos de febre amarela, mas por muito menos que isso, porque pagava por sexo. E contradizia seu próprio discurso. Mas imagine se a imprensa vai falar de coisa tão pouco importante como a seriedade dos políticos e as cobranças sociais. Porque o que dá ibope é saber se a tal cafetina brasileira dormiu com o governador de NY, se ele é bom na horizontal e que outras "otoridades" gringas a mulher faturou.
Por que ela estava presa há quase dois anos e só agora pegaram o governador? Por que não falaram de seus outros clientes, já que ela diz que atendia muita gente? Isso ninguém quer saber. Mas aposto que ela vai receber um convite bem recheado de dinheiro para posar nua para a Playboy. E que muita gente vai comprar a revista. E que no ano que vem ela se candidata a entrar na casa do BBB. E isso vai dar um tremendo ibope.
Pobre Brasil. Sou obrigada a concordar que cada povo tem o governo que merece. O Brasil é que não merece esse povinho. Nem esse governo.
O mais lamentável é que doenças que já deveriam ter sido erradicadas há séculos estão ainda assustando pessoas que moram em capitais. Não, não estou falando de uma cidadezinha no interior do Sergipe, daquelas que, se você passar em quinta marcha, atravessa a cidade e não a vê. Estou falando da capital do Rio de Janeiro, da porta de entrada de boa parte dos turistas que vêm ao Brasil, da antiga capital brasileira, de uma das maiores cidades do País.
E para piorar mais o quadro, os nossos amigos políticos, pessoas conscientes que são, dotados de inteligência ímpar, agora empurram para saber de quem é a culpa. Na Globo hoje cedo, lembraram que, primeiro, o presidente Lula havia dito que o mosquito da dengue era federal. Agora, os seus ministros estadualizaram o mosquito. E o Estado do Rio municipalizou o mosquito. E o município individualizou o mosquito.
No fim, ninguém tem razão, porque, na verdade, a culpa é de todos, governo federal, estadual e muncipais, e também dos cidadãos, que além de não saber votar, ficam achando que Deus protege a casa deles e que, na falta Dele, o Estado Pai o fará. A culpa vai do senhor Lula, que só falou e pouco fez, tanto que o SUS está aquela porcaria e não atende a demanda, ao morador da favela que não levou a sério os 20 mil anúncios que passam na propaganda da novela das 21h ou no Big Brother Brasil sobre não deixar água limpa em pneus, vasos, garrafas etc e que ele solenemente ignorou porque estava usando o celular pré-pago para votar em algum imbecil que estava no paredão da semana.
As "otoridades" também ficam discutindo se 50 mortes (algumas são suspeita de morte por dengue, não se sabe o número certo) é epidemia. E eu me pergunto: qual importância tem se morre uma pessoa ou 1.000 ou 1 milhão? Devemos agir assim que começam os primeiros casos, para não virar epidemia, não é isso que diz a lógica em saúde pública?
Enquanto os inteligentes discutem, as pessoas se desesperam nos postos médicos. E o governador do Rio vai inagurar um centro de hidratação. Achando que isso refresca alguma coisa. Deviam ter jogado uma torta na cara dele, que deixou de cumprir com suas obrigações e agora acha que merece aplauso por estar agindo. Tivesse agido antes, e não ia precisar ter centro de hidratação emergencial no seu Estado.
Mas tudo bem: o mais importante é que crescemos 5% e que a Andréia Schwartz, a prostituta que se envolveu no escândalo que derrubou o governador de Nova York Eliot Spitzer, voltou ao País e tinha trocentos mil jornalistas lá para entrevistá-la. Dizem que a Record pagou pela volta dela, na classe executiva, em troca de uma exclusiva. Dizem que ela só quer dar entrevista para quem pagar por isso. Dizem que ela ajudou nas investigações que derrubou o governador, mas não se sabe bem como.
Pelo que entendi até agora, estão dando importância demais para ela e de menos para o fato de que o governador de NY caiu não porque seu Estado registrou mortes de dengue, ou casos de febre amarela, mas por muito menos que isso, porque pagava por sexo. E contradizia seu próprio discurso. Mas imagine se a imprensa vai falar de coisa tão pouco importante como a seriedade dos políticos e as cobranças sociais. Porque o que dá ibope é saber se a tal cafetina brasileira dormiu com o governador de NY, se ele é bom na horizontal e que outras "otoridades" gringas a mulher faturou.
Por que ela estava presa há quase dois anos e só agora pegaram o governador? Por que não falaram de seus outros clientes, já que ela diz que atendia muita gente? Isso ninguém quer saber. Mas aposto que ela vai receber um convite bem recheado de dinheiro para posar nua para a Playboy. E que muita gente vai comprar a revista. E que no ano que vem ela se candidata a entrar na casa do BBB. E isso vai dar um tremendo ibope.
Pobre Brasil. Sou obrigada a concordar que cada povo tem o governo que merece. O Brasil é que não merece esse povinho. Nem esse governo.
sexta-feira, 21 de março de 2008
quinta-feira, 20 de março de 2008
Eu sou uma anomalia social
Uma socióloga, Eliane Gonçalves, concluiu uma tese de doutorado na Unicamp com o título de “Vidas no singular: noções sobre ‘mulheres sós’ no Brasil contemporâneo”. A Revista Fapesp trouxe uma reportagem sobre a tese. Resumo bem simplificado da história, ela mostra que hoje, mulheres optam por viver sozinhas, ou seja, é uma opção delas. A escolha não é sinônimo de que a tal mulher exige muito, e por isso não consegue o par, nem que se dedicou demais à profissão, nem que sofreu um grande trauma amoroso, nem que perdeu a competição com as mais jovens, como a mídia explica por meio de psicólogos que, pelo visto, entendem pouco do mundo moderno. Ou seja, joga para o tapete todos os estereótipos que eu, mulher solteira e sozinha que sou, enfrento no meu cotidiano.
Eliane diz que "a solteirice tem sido recorrentemente representada como uma falta essencial, uma anomalia social, jamais um caminho, entre outros, escolhido como parte de um projeto de vida que pode ser vivido positivamente.” Realmente, os preconceitos que eu vivo no meu dia-a-dia, as cobranças que me fazem, tudo isso pode ser traduzido pelo fato de que as pessoas me enxergam como uma anomalia social.
Eu não quero ter filho. Nunca quis. Nem meu sobrinho mudou essa minha vontade. A única coisa que me preocupa no fato de não ter filho é quem vai me internar num asilo se eu ficar velhinha e começar a caducar. Tenho um irmão mais novo, mas ele fuma tanto que eu já estou trabalhando a idéia de que vou enterrá-lo, porque dificilmente ele escapará de um câncer. Não sei para quem delegar a tarefa de me botar numa instituição caso eu atinja a tal da melhor idade ou terceira idade, os eufemismos para a inevitável velhice, que é o fim da vida de todo mundo que sobrevive ao percurso.
Eu não quero me casar. Nunca quis. OK. Mentira minha, quis me casar, sim... com o Erick Strada, do Chips, e com o Patrick Swayze, de Dirty Dancing. Juntei os trapos com um ex uma vez. Me arrependi amargamente e acho que essa foi a única coisa que eu fiz na vida da qual me arrependo mesmo, muito, de verdade, do fundo do coração. Geralmente, me arrependo por não ter feito algo. Mas essa foi a pior experiência da minha vida, não porque tenha sido de toda ruim ou me deixado algum trauma, mas porque foi a mais desnecessária das experiências que tive. Porque eu sabia que, pra mim, não servia morar com outra pessoa. Sabia disso antes de me meter na aventura, assim como sempre soube que fogo queima. Eu nunca precisei botar a mãozinha no fogo pra descobrir isso. Não precisa ter me metido nessa história. Tempo e energia jogados fora.
Desde pequena sonhava em ter condição de comprar uma casa própria, minha, só minha, adquirida com meu esforço, meu dinheiro. Ter meu carro, minhas coisas. Casamento, marido, filhos, nada disso fazia parte dos meus sonhos. Queria estudar fora do País, mas até agora não deu. Eu queria morar na Avenida Paulista, num apartamento legal. Claro, essa parte também não realizei. Descobri que detesto apartamentos. E não tinha grana pra comprar nada na região que é um dos metros quadrados mais caros da cidade. Mas comprei minha casa, meu carro, minhas coisas. Fiz o que queria. Agora quero usufruir.
Vez ou outra tenho umas crises, geralmente porque eu tive algum contato mais próximo com o último cara por quem eu me interessei. Mas passam. Até porque eu me pergunto: o que eu vou fazer com um namorado? Além de dormir com ele, claro, não vejo nada que um namorado possa me trazer que eu já não tenha. E relacionamentos dão uma tremenda dor de cabeça. Pra que eu vou arrumar dor de cabeça, se um cara na minha vida não vai acrescentar quase nada a ela? Pra que vou me irritar, tendo de me virar em vinte para deixar minha casa arrumadinha, meu corpo em ordem, o humor em ordem, abrir mão do meu tempo livre, de ver minha família, amigos, para ficar com um sujeito que me trará, como bônus, apenas o fato de dormir comigo? Sexo é fácil de se resolver, não precisa namorar e se ralar num relacionamento sério para conseguir isso no mundo de hoje.
E não me venham com o papinho de que há coisas boas num relacionamento, porque elas existem, mas na minha balança, pesam menos do que o esforço que se faz para manter o relacionamento de pé. E tanto é verdade que eu conheço muitos, muitos e muitos casais. A maioria é infeliz no casamento. Os mais novos separam. Dos últimos casórios que assisti, o casamento da Ana durou menos de dois anos. O casamento da Ju idem. O casamento do João durou exatos nove meses! Nove meses, percebem? Casamento hoje não tem mais a crise dos sete anos. Porque não chega aos sete para ter crise.
Além das pessoas não entenderem mesmo, nem aceitarem minha maneira de viver, ainda me obrigam a ficar justificando minhas escolhas. Eu realmente tô com o saco cheio de ficar dando explicação. Porque, na verdade, o problema não é meu, mas delas, se a minha solidão as incomoda. A mim não atrapalha em nada, estou satisfeita com a vida que levo. Então, pessoas, quem tem de fazer tratamento psicológico, terapia de florais, meditação, virar budista, fazer descarrego, 'trabalho', rezar, entrar pro site de relacionamentos Par Pefeito e blablablá são vocês, não eu, viu?
Para ler a matéria da Fapesp, clique aqui.
Eliane diz que "a solteirice tem sido recorrentemente representada como uma falta essencial, uma anomalia social, jamais um caminho, entre outros, escolhido como parte de um projeto de vida que pode ser vivido positivamente.” Realmente, os preconceitos que eu vivo no meu dia-a-dia, as cobranças que me fazem, tudo isso pode ser traduzido pelo fato de que as pessoas me enxergam como uma anomalia social.
Eu não quero ter filho. Nunca quis. Nem meu sobrinho mudou essa minha vontade. A única coisa que me preocupa no fato de não ter filho é quem vai me internar num asilo se eu ficar velhinha e começar a caducar. Tenho um irmão mais novo, mas ele fuma tanto que eu já estou trabalhando a idéia de que vou enterrá-lo, porque dificilmente ele escapará de um câncer. Não sei para quem delegar a tarefa de me botar numa instituição caso eu atinja a tal da melhor idade ou terceira idade, os eufemismos para a inevitável velhice, que é o fim da vida de todo mundo que sobrevive ao percurso.
Eu não quero me casar. Nunca quis. OK. Mentira minha, quis me casar, sim... com o Erick Strada, do Chips, e com o Patrick Swayze, de Dirty Dancing. Juntei os trapos com um ex uma vez. Me arrependi amargamente e acho que essa foi a única coisa que eu fiz na vida da qual me arrependo mesmo, muito, de verdade, do fundo do coração. Geralmente, me arrependo por não ter feito algo. Mas essa foi a pior experiência da minha vida, não porque tenha sido de toda ruim ou me deixado algum trauma, mas porque foi a mais desnecessária das experiências que tive. Porque eu sabia que, pra mim, não servia morar com outra pessoa. Sabia disso antes de me meter na aventura, assim como sempre soube que fogo queima. Eu nunca precisei botar a mãozinha no fogo pra descobrir isso. Não precisa ter me metido nessa história. Tempo e energia jogados fora.
Desde pequena sonhava em ter condição de comprar uma casa própria, minha, só minha, adquirida com meu esforço, meu dinheiro. Ter meu carro, minhas coisas. Casamento, marido, filhos, nada disso fazia parte dos meus sonhos. Queria estudar fora do País, mas até agora não deu. Eu queria morar na Avenida Paulista, num apartamento legal. Claro, essa parte também não realizei. Descobri que detesto apartamentos. E não tinha grana pra comprar nada na região que é um dos metros quadrados mais caros da cidade. Mas comprei minha casa, meu carro, minhas coisas. Fiz o que queria. Agora quero usufruir.
Vez ou outra tenho umas crises, geralmente porque eu tive algum contato mais próximo com o último cara por quem eu me interessei. Mas passam. Até porque eu me pergunto: o que eu vou fazer com um namorado? Além de dormir com ele, claro, não vejo nada que um namorado possa me trazer que eu já não tenha. E relacionamentos dão uma tremenda dor de cabeça. Pra que eu vou arrumar dor de cabeça, se um cara na minha vida não vai acrescentar quase nada a ela? Pra que vou me irritar, tendo de me virar em vinte para deixar minha casa arrumadinha, meu corpo em ordem, o humor em ordem, abrir mão do meu tempo livre, de ver minha família, amigos, para ficar com um sujeito que me trará, como bônus, apenas o fato de dormir comigo? Sexo é fácil de se resolver, não precisa namorar e se ralar num relacionamento sério para conseguir isso no mundo de hoje.
E não me venham com o papinho de que há coisas boas num relacionamento, porque elas existem, mas na minha balança, pesam menos do que o esforço que se faz para manter o relacionamento de pé. E tanto é verdade que eu conheço muitos, muitos e muitos casais. A maioria é infeliz no casamento. Os mais novos separam. Dos últimos casórios que assisti, o casamento da Ana durou menos de dois anos. O casamento da Ju idem. O casamento do João durou exatos nove meses! Nove meses, percebem? Casamento hoje não tem mais a crise dos sete anos. Porque não chega aos sete para ter crise.
Além das pessoas não entenderem mesmo, nem aceitarem minha maneira de viver, ainda me obrigam a ficar justificando minhas escolhas. Eu realmente tô com o saco cheio de ficar dando explicação. Porque, na verdade, o problema não é meu, mas delas, se a minha solidão as incomoda. A mim não atrapalha em nada, estou satisfeita com a vida que levo. Então, pessoas, quem tem de fazer tratamento psicológico, terapia de florais, meditação, virar budista, fazer descarrego, 'trabalho', rezar, entrar pro site de relacionamentos Par Pefeito e blablablá são vocês, não eu, viu?
Para ler a matéria da Fapesp, clique aqui.
quarta-feira, 19 de março de 2008
Marcos e sua Mel
Sexta, dia 14 de março, estava eu esperando ônibus na Teodoro Sampaio, em direção ao Unibanco-Unibosta, para finalmente, depois de seis anos, quitar a minha casa. Me livrar da dívida, dizer que agora a casa é minha e poder vendê-la porque não agüento mais morar em condomínio. No ponto, pára um senhor, acompanhado de uma cachorra dálmata tão educada, mas tão educada, mas tão educada, que quase a pedi emprestada para dar aula de boas maneiras para aqueles pulhas dos meus vizinhos e de suas crianças igualmente insuportáveis e sem modos ou respeito pelo espaço e direito do próximo.
"Eu ia fazer alguma coisa, mas esqueci o que era", diz o dono da cachorra, para mim. Assim, do nada. Eu só ri. "Eu saí, ia para o veterinário, mas agora não sei o que era. Banho ela já tomou. Vacina ela já tomou. Acho que ia perguntar alguma coisa. A idade é fogo. Bem, uma hora eu lembro!", completou o senhor. Me identifiquei com ele, porque também sou assim, desmemoriada. O camarada era muito gentil e muito educado.
Nisso, uma moça japonesa que também tem dálmata parou para brincar com a cachorra. E todo mundo, praticamente, parava para ver a bichinha. Linda, linda, e toda educada, andava sem coleira e não botou o pé, ou melhor, a pata na rua em nenhum momento. Não avançou em ninguém, não latiu para ninguém, só olhava as pessoas. Atende ordem em italiano, português, francês... Pode mandar a danada sentar em várias línguas que ela entende. E entende também por gestos, me explicou o dono, contando que ficou mudo esses dias por uma crise de laringite e só falou com a cachorra por gestos no período em que esteve doente.
Perguntei quantos anos tem a Mel. O dono respondeu: "na idade dela ou na nossa?" Eu, "na dela". "Ela tem 7,5 anos". Mas a danadinha tem cara de menininha, de um filhotão super-desenvolvido. Depois de ver o sucesso dela no calçadão da Teodoro, ele comentou: " A Mel é mais conhecida em Pinheiros do que nota de R$ 1,00". E deve ser mesmo, algumas pessoas pararam para cumprimentá-la pelo nome e tudo. Era uma pessoa de quatro patas ali na calçada, praticamente.
Ao se despedir, o dono da Mel pergunta para mim. "Qual sua graça?" Digo meu nome, desejo a ele bom final de semana e ele beija a minha mão ao se despedir. Faz o mesmo com a outra moça que estava ali, conversando. Pergunto para ele seu nome. "Eu sou o Marcos." E segue Teodoro abaixo com sua Mel, sem lembrar o que ia fazer no veterinário. Enquanto isso, eu pensava: todo cachorro deve ser mesmo reflexo do seu dono... rsrsrs Espero que os imbecis dos meus vizinhos nunca tenham cachorro, imagine que bicho mais mal educado sairia da casa deles...
"Eu ia fazer alguma coisa, mas esqueci o que era", diz o dono da cachorra, para mim. Assim, do nada. Eu só ri. "Eu saí, ia para o veterinário, mas agora não sei o que era. Banho ela já tomou. Vacina ela já tomou. Acho que ia perguntar alguma coisa. A idade é fogo. Bem, uma hora eu lembro!", completou o senhor. Me identifiquei com ele, porque também sou assim, desmemoriada. O camarada era muito gentil e muito educado.
Nisso, uma moça japonesa que também tem dálmata parou para brincar com a cachorra. E todo mundo, praticamente, parava para ver a bichinha. Linda, linda, e toda educada, andava sem coleira e não botou o pé, ou melhor, a pata na rua em nenhum momento. Não avançou em ninguém, não latiu para ninguém, só olhava as pessoas. Atende ordem em italiano, português, francês... Pode mandar a danada sentar em várias línguas que ela entende. E entende também por gestos, me explicou o dono, contando que ficou mudo esses dias por uma crise de laringite e só falou com a cachorra por gestos no período em que esteve doente.
Perguntei quantos anos tem a Mel. O dono respondeu: "na idade dela ou na nossa?" Eu, "na dela". "Ela tem 7,5 anos". Mas a danadinha tem cara de menininha, de um filhotão super-desenvolvido. Depois de ver o sucesso dela no calçadão da Teodoro, ele comentou: " A Mel é mais conhecida em Pinheiros do que nota de R$ 1,00". E deve ser mesmo, algumas pessoas pararam para cumprimentá-la pelo nome e tudo. Era uma pessoa de quatro patas ali na calçada, praticamente.
Ao se despedir, o dono da Mel pergunta para mim. "Qual sua graça?" Digo meu nome, desejo a ele bom final de semana e ele beija a minha mão ao se despedir. Faz o mesmo com a outra moça que estava ali, conversando. Pergunto para ele seu nome. "Eu sou o Marcos." E segue Teodoro abaixo com sua Mel, sem lembrar o que ia fazer no veterinário. Enquanto isso, eu pensava: todo cachorro deve ser mesmo reflexo do seu dono... rsrsrs Espero que os imbecis dos meus vizinhos nunca tenham cachorro, imagine que bicho mais mal educado sairia da casa deles...
quinta-feira, 13 de março de 2008
Um olhar
Foi coisa de um ou dois segundos... Um cruzar de olhos na esquina, cada um dentro do seu carro. Eu esperava para entrar na avenida, ele vinha com seu carro no sentido contrário para entrar na rua onde eu estava parada, aguardando que ele passasse na minha frente e que o ônibus parado no ponto na avenida saísse, para me dar visão do sentido oposto. Ele virou, entrou e ao passar do meu lado, me olhou. Eu já estava olhando para esse lado. Cruzamos a vista, ele estava de cara feia e parecia ter me fuzilado. Será que eu estava com o carro muito no meio da rua? Não, oras, até caminhão entrava ali!
Eu fiquei parada, olhando seu carro subir a rua, disse um "uau" para mim mesma, e esqueci que estava aguardando para entrar na avenida. Me pegou de surpresa aquele olhar, não sei bem porquê. Quer dizer, foi um olhar que veio do nada, inesperado, eu nem esperava encontrar alguém conhecido aquela hora da madrugada, e um olhar daqueles breves, mas profundos, claros, que deixa você sem saber o que fazer, te congela.
Agora estou com ele na minha cabeça e lembrando de outras raras vezes que a gente se pegou um olhando pra cara do outro. Olha, para ser bem honesta, não sei nem se o dono do olhar é quem eu penso que é. Perguntei pra mamãe sobre o carro dele, para ver se é mesmo quem eu imagino que seja. Minha carência atingiu um pico da altura do Himalaia e, nessas condições, toda a racionalidade vai pro espaço e eu começo a ver e imaginar coisas.
Mamys ficou de checar qual o carro do moço. Comentei assim, como quem não quer nada: "mã, eu estava na esquina esperando para entrar na avenida e o Ricardo - acho que era ele - entrou do outro lado e me olhou tãaaaaaaaaaaaaaaaoooo feio que achei melhor ir pedir desculpas, ou ele vai me prender por atrapalhar o trânsito na rua! rsrsrs O carro dele é um Celta cinza?" Ela não sabia, mas não entende de modelo de carro, então vai xeretar na garagem, quando passar na frente da casa dele. Que feio isso, né? Mamy não é boba, sabe que se ele desse brecha, eu embarcava no camburão e ia pra cadeia com ele! E como ela sempre gostou do menino, aprovou meu interesse... hehehehe
Bem, sendo Ricardo ou não, eu fiquei com Ricardo e seu olhar feio na cabeça. Na verdade, já estava pensando nele esses dias pelo fato de mamys ter me contado que o moço estava solteiro novamente. Tinha ido morar com a namorada, mas a menina queria comprar um apê para ela e não contribuía com nada nas contas da casa, além de jogar suas compras pessoais - presente para amigas, calça para ela etc - no cartão dele. Ele se encheu e resolveu cuidar da própria vida.
Ricardo é um moço lindo - o dia que me virem falando com interesse de um moço feio, me internem ou rezem, porque o mundo está acabando. Eu não sou modesta quanto a homem, gosto sempre do mais bonito, mesmo sendo eu de uma beleza equivalente ao lado avesso das Giseles e Cicarrellis da vida. É sou superficial também, adoro embalagens.
Mas voltando ao tema R. O menino mudou pra rua da mamys quando éramos criança. Deve ter uns dois anos a menos que eu. Logo que chegou, foi um furor na rua. As meninas, mesmo ainda crianças, já se assanharam. As duas Patrícias - uma delas, conhecida por ser na época a mais bonita do bairro - aquela imbecil da Soninha, acho que até Márcia e Marisa... todas as meninas, praticamente, se interessaram pelo moleque. Moreno, pele jambo, olhos verdes, cabelos castanhos claros, magro e alto. Tudo de bom, desde criança.
O menino era poderoso. A outra Patrícia, por exemplo, era doida por ele: mandava carta, bilhete, o diabo. Disse que se não o namorasse até completar 15 anos, ia virar freira. E ele nunca ligou pra ela, apesar de eu ter tentando até fazer um pequeno lobby a favor da menina. Não lembro como e nem o que o Ricardo disse, mas ele cortou a história, apesar de se sentir bem em ver uma menina tão doida por ele. Lembro vagamente dele sorrir quando falei sobre ela com ele, brevemente.
Ricardo estava numa fase moleque, não tinha idade nem vontade de namorar. Ele sempre foi fechadão e quieto, caladão mesmo. Brincava pouco com a gente, não era de papo. Estudava, nunca deu trabalho para os pais, sempre foi bastante sério e responsável. Me identificava com ele, mas não tinha como sermos amigos. Por meu irmão ser amigo dele, ainda consegui arrancar uma ou duas palavras do menino. Mas também não me joguei. Se nem as belas tiveram chance, imagine eu, magrelinha e CDF, tímida e sem muito o que contar de interessante... Então, apesar de uma brincadeira ou outra de duplo sentido, nada ficou explícito para ele e eu deixei o interesse que mal tinha aflorado morrer. Eu também era muito criança e ia acabar estragando a amizade dele com meu irmão.
Tinha orgulho por ser a única que conseguia, na brincadeira de pega-pega ou rouba bandeira ou duro ou mole (cada nome dúbio esse das brincadeiras, não?), pegar os meninos que corriam mais: Serginho, Cesar e Ricardo. E podia acompanhá-los na bicicleta e me desviar das inevitáveis fechadas. Mas na bicicleta, só andava em companhia do Sergio e do Cesar, o Ricardo era de sair pouco na rua. Foi assim de moleque, cresceu e continuou assim, reservado. Com o tempo, cada um foi para o seu lado e perdi o contato com todos eles. Inclusive os esparsos contatos com o Ricardo.
Eu sempre tive uma cisma com ele de que me olhava feio, bravo. Vez ou outra eu o vejo na rua da mamys e olho, confesso, com olhar de cobiça. Se ele se dá ao trabalho de olhar, sempre está com cara fechada e olha feio. Minha mãe diz que ele é assim, olha feio pra todo mundo. Acho que deve ser mesmo. Vai ver que é por isso que virou policial. Dizem que um bom policial. Pelo menos, não está metido em corrupção, porque o padrão de vida dele e da família mudou pouco.
Ai, ai, se eu fosse corajosa, podia falar para ele que cara feia pra mim é fome... E perguntaria, com uma piscadinha: Ricardo, você tem fome de quê? rsrsrsrs
Eu fiquei parada, olhando seu carro subir a rua, disse um "uau" para mim mesma, e esqueci que estava aguardando para entrar na avenida. Me pegou de surpresa aquele olhar, não sei bem porquê. Quer dizer, foi um olhar que veio do nada, inesperado, eu nem esperava encontrar alguém conhecido aquela hora da madrugada, e um olhar daqueles breves, mas profundos, claros, que deixa você sem saber o que fazer, te congela.
Agora estou com ele na minha cabeça e lembrando de outras raras vezes que a gente se pegou um olhando pra cara do outro. Olha, para ser bem honesta, não sei nem se o dono do olhar é quem eu penso que é. Perguntei pra mamãe sobre o carro dele, para ver se é mesmo quem eu imagino que seja. Minha carência atingiu um pico da altura do Himalaia e, nessas condições, toda a racionalidade vai pro espaço e eu começo a ver e imaginar coisas.
Mamys ficou de checar qual o carro do moço. Comentei assim, como quem não quer nada: "mã, eu estava na esquina esperando para entrar na avenida e o Ricardo - acho que era ele - entrou do outro lado e me olhou tãaaaaaaaaaaaaaaaoooo feio que achei melhor ir pedir desculpas, ou ele vai me prender por atrapalhar o trânsito na rua! rsrsrs O carro dele é um Celta cinza?" Ela não sabia, mas não entende de modelo de carro, então vai xeretar na garagem, quando passar na frente da casa dele. Que feio isso, né? Mamy não é boba, sabe que se ele desse brecha, eu embarcava no camburão e ia pra cadeia com ele! E como ela sempre gostou do menino, aprovou meu interesse... hehehehe
Bem, sendo Ricardo ou não, eu fiquei com Ricardo e seu olhar feio na cabeça. Na verdade, já estava pensando nele esses dias pelo fato de mamys ter me contado que o moço estava solteiro novamente. Tinha ido morar com a namorada, mas a menina queria comprar um apê para ela e não contribuía com nada nas contas da casa, além de jogar suas compras pessoais - presente para amigas, calça para ela etc - no cartão dele. Ele se encheu e resolveu cuidar da própria vida.
Ricardo é um moço lindo - o dia que me virem falando com interesse de um moço feio, me internem ou rezem, porque o mundo está acabando. Eu não sou modesta quanto a homem, gosto sempre do mais bonito, mesmo sendo eu de uma beleza equivalente ao lado avesso das Giseles e Cicarrellis da vida. É sou superficial também, adoro embalagens.
Mas voltando ao tema R. O menino mudou pra rua da mamys quando éramos criança. Deve ter uns dois anos a menos que eu. Logo que chegou, foi um furor na rua. As meninas, mesmo ainda crianças, já se assanharam. As duas Patrícias - uma delas, conhecida por ser na época a mais bonita do bairro - aquela imbecil da Soninha, acho que até Márcia e Marisa... todas as meninas, praticamente, se interessaram pelo moleque. Moreno, pele jambo, olhos verdes, cabelos castanhos claros, magro e alto. Tudo de bom, desde criança.
O menino era poderoso. A outra Patrícia, por exemplo, era doida por ele: mandava carta, bilhete, o diabo. Disse que se não o namorasse até completar 15 anos, ia virar freira. E ele nunca ligou pra ela, apesar de eu ter tentando até fazer um pequeno lobby a favor da menina. Não lembro como e nem o que o Ricardo disse, mas ele cortou a história, apesar de se sentir bem em ver uma menina tão doida por ele. Lembro vagamente dele sorrir quando falei sobre ela com ele, brevemente.
Ricardo estava numa fase moleque, não tinha idade nem vontade de namorar. Ele sempre foi fechadão e quieto, caladão mesmo. Brincava pouco com a gente, não era de papo. Estudava, nunca deu trabalho para os pais, sempre foi bastante sério e responsável. Me identificava com ele, mas não tinha como sermos amigos. Por meu irmão ser amigo dele, ainda consegui arrancar uma ou duas palavras do menino. Mas também não me joguei. Se nem as belas tiveram chance, imagine eu, magrelinha e CDF, tímida e sem muito o que contar de interessante... Então, apesar de uma brincadeira ou outra de duplo sentido, nada ficou explícito para ele e eu deixei o interesse que mal tinha aflorado morrer. Eu também era muito criança e ia acabar estragando a amizade dele com meu irmão.
Tinha orgulho por ser a única que conseguia, na brincadeira de pega-pega ou rouba bandeira ou duro ou mole (cada nome dúbio esse das brincadeiras, não?), pegar os meninos que corriam mais: Serginho, Cesar e Ricardo. E podia acompanhá-los na bicicleta e me desviar das inevitáveis fechadas. Mas na bicicleta, só andava em companhia do Sergio e do Cesar, o Ricardo era de sair pouco na rua. Foi assim de moleque, cresceu e continuou assim, reservado. Com o tempo, cada um foi para o seu lado e perdi o contato com todos eles. Inclusive os esparsos contatos com o Ricardo.
Eu sempre tive uma cisma com ele de que me olhava feio, bravo. Vez ou outra eu o vejo na rua da mamys e olho, confesso, com olhar de cobiça. Se ele se dá ao trabalho de olhar, sempre está com cara fechada e olha feio. Minha mãe diz que ele é assim, olha feio pra todo mundo. Acho que deve ser mesmo. Vai ver que é por isso que virou policial. Dizem que um bom policial. Pelo menos, não está metido em corrupção, porque o padrão de vida dele e da família mudou pouco.
Ai, ai, se eu fosse corajosa, podia falar para ele que cara feia pra mim é fome... E perguntaria, com uma piscadinha: Ricardo, você tem fome de quê? rsrsrsrs
quinta-feira, 6 de março de 2008
Por você
Por você, eu não apenas dançaria tango no teto, ou limparia os trilhos do metrô ou iria a pé do Rio a Salvador, como canta Frejat. Por você, eu seria aquela mulher que eu detesto. Aquela que diz sim a tudo, que se transforma na pessoa mais dócil e obediente do que todos os cães vira-latas conhecidos, que passa a gostar de coisas detestáveis só para agradá-lo. Por você, eu abriria mão de meus valores, eu toparia ser sua amante, toparia que você tivesse outras amantes - e esposa. Eu não ligaria de ficar em quarto ou quinto plano na sua lista de prioridades. Aliás, por você, eu toparia ficar fora da sua lista de prioridades. Por você, eu comeria comidas estranhas, iria a lugares esquisitos, eu beberia ou não, eu fumaria, ou não, eu baixaria a cabeça quando você mandasse, eu nunca levantaria o tom de voz se te irritasse, não iria mais rir alto, eu não choraria. Eu trocaria todas as roupas e calçados do meu guarda-roupas, iria me maquiar, ou deixar de me maquiar, se te agradasse. Por você, ultrapassaria todos os limites, perderia o medo das coisas. Largaria meus amigos, meu trabalho e a carreira, meus estudos, minha casa, meu carro, tudo o que construí, se fosse para ficar do seu lado. Deixaria de lado meus planos, deixaria de lado minha vida, e só não largaria mesmo minha família e minhas cachorras... Teria filhos, vários filhos, teria vida familiar, aprenderia a cozinhar-lavar-passar, seria para você a perfeita Amélia, "a mulher de verdade". Por você me rebaixaria, seria capacho para você pisar, alguém para você descontar suas frustrações e mau humor, viraria uma mãe para poder cuidar de você, te mimaria mais do que já o mimaram, e faria ceninha de ciúme e seria pegajosa para mostrar a você e ao seu ego que você é tudo para mim. Eu não diria não a você. Por você, eu deixaria de ser eu para ser o que você quisesse. E é por isso, por você ter esse poder de me transformar nessa figura patética, que você e eu nunca poderíamos dar certo juntos.
quarta-feira, 5 de março de 2008
A ilusão
Pode ser ilusão pura da minha parte. Deve ser. Quero que seja, porque se não for, talvez ele não seja tão boa gente como eu acho que é. E talvez eu não seja tão boa gente como acho que sou, porque sinto um sorriso malvado se desenhando na minha boca só de imaginar que tudo pode ser realidade. E a realidade se refere a um fato: tenho tido a nítida impressão de incomodar a namorada de um moço. Bem, é namoro sério, de virar casório e tudo. Eu fiquei com ele, gosto dele até hoje, cortei papo e agora que achei que estava mais forte, resolvi retomar um contato mais cordial com o menino.
Contato é aquele básico: oi, tudo bem? uma perguntinha aqui, uma risada de uma piada acolá, um complemento de piada depois... Tudo civilizado, sem dar em cima dele, sem forçar, eu acho, ou pelo menos tento agir assim. Tô tentando não deixar transparecer que ainda gosto dele, mesmo quando ele sorri ao fazer as brincadeiras de duplo sentido que ele gosta de fazer ou quando ele está dançando.
E ele brinca comigo, e com todos na mesa, e parece se sentir bem quando eu o trato bem. Deve ser difícil para ele entender porque eu sequer posso dar um oi, tudo bem? É, nenê, é que doía, muito, olhar pra você. Imagine falar. Impossível até pouco tempo atrás.
Comigo diretamente ele fala vez por outra, mas quando isso ocorre, coincidentemente, logo em seguida, ele olha para a namorada e dá um beijinho na moça ou faz um agradinho. Posso estar vendo demais. Pode ser coincidência. Mas meu sexto sentido apita muito quando estamos todos juntos. Trombou na mesa, quase derrubou tudo, eu comentei "essas pessoas grandes...." e a moça faz um cara de cú. E ele depressinha deu beijinho na fera. Eu hein! Foi embora e não deu tchau. De novo esse comportamento mal educado e contraditório. O que ele quer, que eu corra atrás? Quer chamar a minha atenção? Eu hein!
Da minha parte, saio cansada depois de passar tanto tempo me controlando, mas saio sempre achando que enganei. Contudo, mulher é um trem esquisito mesmo, consegue captar coisas nos outros antes mesmo que os outros se dêem conta do que está acontecendo. Dizem que a mulherada sabe que o marido vai chifrá-la antes dele conhecer a futura amante. Eu não sou assim, mas sei lá, tem gente que pode ser né? Vai saber se a menina não percebeu ou até mesmo já não sabe que eu fui e sou doida pelo namorado dela. Normal ela ficar com ciúme. Só não sei o porquê disso. Afinal, ele está com ela, não comigo, certo?
Talvez ele devesse ficar na dele, não falar comigo, se é o caso de estar atrapalhando o namoro. E se ele não o faz, chegamos na parte da minha provável decepção. Bem, ele gosta de ter o ego amaciado, não seria surpresa, mas estou falando da futura mulher dos filhos dele, acho que poderia não provocar a moça só para afagar sua vaidade.
Da minha parte, gostaria de não estar sentindo essas coisas. Porque é errado me sentir assim. O menino tem outra, tenho de entender, respeitar, aceitar e não ficar caçando assunto. Mas a paixão - ou a obsessão ou a doença ou o que quer que seja isso que sinto por ele - é uma merda mesmo. Insiste em ficar alimentando chamas quase apagadas pela falta de oxigênio. Meu sexto sentido está me pregando peça, na loucura de querer dar a mim uma importância que não tenho na vida dele. De dar um fio de esperança de que ele talvez tenha gostado de mim um pouquinho depois de termos ficado juntos, tanto tempo atrás. De abrir possibilidade para um quem sabe a gente poderia tentar ficar junto depois de tudo. Um monte de hipótese, nenhuma plausível com a realidade, todas com base nessa ilusão criada pelo meu sexto sentido. E também sem nexo, porque eu não faria o moço feliz. E com isso, eu também seria infeliz. Nada daria certo entre a gente, muito gênio, muita teimosia juntos.
De qualquer forma, queria encerrar com um recado para a moça e para mim mesma: fia, gosto tanto do seu namorado que, se ele está feliz, e eu sei que ele está, eu é que não vou atrapalhar a felicidade dele, viu? Pode ficar sossegada, não dou em cima de homem comprometido, mesmo que adore o rapaz, como é o caso. E mesmo que ele sente e encoste a perna dele na minha sem querer (foi sem querer mesmo, acredite), como ontem, eu não abuso. Me afasto bem afastado, porque não é meu. Faça-o feliz e está bom, nada vai acontecer, não se preocupe. Ele está muito bem com você. Veja se não vai estragar tudo. E se o caso sou eu, que estou vendo demais, esqueça o que eu escrevi.
Contato é aquele básico: oi, tudo bem? uma perguntinha aqui, uma risada de uma piada acolá, um complemento de piada depois... Tudo civilizado, sem dar em cima dele, sem forçar, eu acho, ou pelo menos tento agir assim. Tô tentando não deixar transparecer que ainda gosto dele, mesmo quando ele sorri ao fazer as brincadeiras de duplo sentido que ele gosta de fazer ou quando ele está dançando.
E ele brinca comigo, e com todos na mesa, e parece se sentir bem quando eu o trato bem. Deve ser difícil para ele entender porque eu sequer posso dar um oi, tudo bem? É, nenê, é que doía, muito, olhar pra você. Imagine falar. Impossível até pouco tempo atrás.
Comigo diretamente ele fala vez por outra, mas quando isso ocorre, coincidentemente, logo em seguida, ele olha para a namorada e dá um beijinho na moça ou faz um agradinho. Posso estar vendo demais. Pode ser coincidência. Mas meu sexto sentido apita muito quando estamos todos juntos. Trombou na mesa, quase derrubou tudo, eu comentei "essas pessoas grandes...." e a moça faz um cara de cú. E ele depressinha deu beijinho na fera. Eu hein! Foi embora e não deu tchau. De novo esse comportamento mal educado e contraditório. O que ele quer, que eu corra atrás? Quer chamar a minha atenção? Eu hein!
Da minha parte, saio cansada depois de passar tanto tempo me controlando, mas saio sempre achando que enganei. Contudo, mulher é um trem esquisito mesmo, consegue captar coisas nos outros antes mesmo que os outros se dêem conta do que está acontecendo. Dizem que a mulherada sabe que o marido vai chifrá-la antes dele conhecer a futura amante. Eu não sou assim, mas sei lá, tem gente que pode ser né? Vai saber se a menina não percebeu ou até mesmo já não sabe que eu fui e sou doida pelo namorado dela. Normal ela ficar com ciúme. Só não sei o porquê disso. Afinal, ele está com ela, não comigo, certo?
Talvez ele devesse ficar na dele, não falar comigo, se é o caso de estar atrapalhando o namoro. E se ele não o faz, chegamos na parte da minha provável decepção. Bem, ele gosta de ter o ego amaciado, não seria surpresa, mas estou falando da futura mulher dos filhos dele, acho que poderia não provocar a moça só para afagar sua vaidade.
Da minha parte, gostaria de não estar sentindo essas coisas. Porque é errado me sentir assim. O menino tem outra, tenho de entender, respeitar, aceitar e não ficar caçando assunto. Mas a paixão - ou a obsessão ou a doença ou o que quer que seja isso que sinto por ele - é uma merda mesmo. Insiste em ficar alimentando chamas quase apagadas pela falta de oxigênio. Meu sexto sentido está me pregando peça, na loucura de querer dar a mim uma importância que não tenho na vida dele. De dar um fio de esperança de que ele talvez tenha gostado de mim um pouquinho depois de termos ficado juntos, tanto tempo atrás. De abrir possibilidade para um quem sabe a gente poderia tentar ficar junto depois de tudo. Um monte de hipótese, nenhuma plausível com a realidade, todas com base nessa ilusão criada pelo meu sexto sentido. E também sem nexo, porque eu não faria o moço feliz. E com isso, eu também seria infeliz. Nada daria certo entre a gente, muito gênio, muita teimosia juntos.
De qualquer forma, queria encerrar com um recado para a moça e para mim mesma: fia, gosto tanto do seu namorado que, se ele está feliz, e eu sei que ele está, eu é que não vou atrapalhar a felicidade dele, viu? Pode ficar sossegada, não dou em cima de homem comprometido, mesmo que adore o rapaz, como é o caso. E mesmo que ele sente e encoste a perna dele na minha sem querer (foi sem querer mesmo, acredite), como ontem, eu não abuso. Me afasto bem afastado, porque não é meu. Faça-o feliz e está bom, nada vai acontecer, não se preocupe. Ele está muito bem com você. Veja se não vai estragar tudo. E se o caso sou eu, que estou vendo demais, esqueça o que eu escrevi.
Chatice sem fim
Semana chata. Segunda, enrolei e nada de escrever o texto. Mandei um mais simples, sobre mapeamento de cana para produção de etanol. E agora minha editora me diz que não tem assunto que nos interessa ali. Se não tem, por que pediu a porra da matéria?
Ontem fiquei correndo atrás do Lula em Campinas. Tenho duas matérias boas, mas a chefe só se interessou por uma, até agora. Pra que eu me mato? Por que tenho essa mania de querer fazer mais do que me pedem? Essa porra de complexo de inferioridade: me desculpe ser burra, mas sou esforçadinha, viu, olha como eu faço mais do que me pedem para compensar a burrice.
E pra piorar o dia, cólica. Calor insuportável, mosquitos idem no lugar onde estava esperando Lula e as "otoridades", dirigir pra baixo e pra cima, ficar naquela de o presidente vai falar ou não, imprensa entra por aqui, cadê a foto da sua credencial e blablabla. Tudo acompanhado pela cólica maldita. Coisa estranha isso, já vi em piada, mas sempre me pego pensando no assunto: como é que um ser vivo sangra todo mês, por vários dias, e não morre?
Aí, tinha festa árabe ontem, lugar novo. Fui, e como imaginei, calcularam mal o espaço pro dabke. Se aquilo não aumentar, terei de mudar da festa de terça pra festa de domingo, onde o espaço pra roda é maior. E a música pior. Caralho, nada pode ser perfeito nessa vida, nada?
Ontem fiquei correndo atrás do Lula em Campinas. Tenho duas matérias boas, mas a chefe só se interessou por uma, até agora. Pra que eu me mato? Por que tenho essa mania de querer fazer mais do que me pedem? Essa porra de complexo de inferioridade: me desculpe ser burra, mas sou esforçadinha, viu, olha como eu faço mais do que me pedem para compensar a burrice.
E pra piorar o dia, cólica. Calor insuportável, mosquitos idem no lugar onde estava esperando Lula e as "otoridades", dirigir pra baixo e pra cima, ficar naquela de o presidente vai falar ou não, imprensa entra por aqui, cadê a foto da sua credencial e blablabla. Tudo acompanhado pela cólica maldita. Coisa estranha isso, já vi em piada, mas sempre me pego pensando no assunto: como é que um ser vivo sangra todo mês, por vários dias, e não morre?
Aí, tinha festa árabe ontem, lugar novo. Fui, e como imaginei, calcularam mal o espaço pro dabke. Se aquilo não aumentar, terei de mudar da festa de terça pra festa de domingo, onde o espaço pra roda é maior. E a música pior. Caralho, nada pode ser perfeito nessa vida, nada?
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