Num mundo consumista, tudo é marketing. Num mundo em que tudo é marketing, para tudo há marca e rótulo. Pois bem... Descobri que sou uma adepta de um tal movimento chamado simplicidade voluntária. Quer dizer, se alguém me ouvir falar sobre minha decisão de simplificar a vida, vai me botar essa porra de rótulo na cara. Na boa, nunca tinha ouvido falar da tal simplicidade voluntária até o fim de semana último. Entendi que o tal movimento engloba coisas como não ao consumismo, vamos todos andar de bicicleta, coma orgânicos e não aos transgênicos, e a preocupação do povo engajado nisso é centrada na questão ambiental. Aí achei que a tal etiqueta não combinava muito com minha testa.
A questão da vida mais simples, para mim, tem relação direta com o consumismo e com o fato de que a mídia e suas propagandas - diretas e indiretas - não podem ou não devem emburrecer demais as pessoas, como vemos ocorrer hoje no tal mundo globalizado. Já falei aqui: basear a vida no verbo ter é levar uma vida besta. A gente se mata de trabalhar para ganhar dinheiro e consumir. Vamos adquirir coisas que vão nos obrigar a trabalhar mais para mantê-las. É um círculo vicioso sem fim, e, pior, sem sentido, sem objetivo. Ter e ter. Depois ninguém entende porque há tantos deprimidos-violentos-desestruturados por aí. Não vivo para trabalhar. Trabalho para viver. Quero ficar com minha família, ver meus amigos, quero fazer coisas que não vão ser investimento na carreira nem se reverter em lucro, quero aprender por aprender, quero ter tempo pra ficar sem fazer nada no sofá, pra ver programa lixo na TV. Não quero viver pensando em como ganhar dinheiro. Até aqui, eu e o tal movimento estamos casados.
Já essa coisa toda de pensar no meio ambiente, nas futuras gerações... lindo, lindo. Mas não funciona muito comigo. Não funciona por questões práticas: alimentos orgânicos, por exemplo, são mais caros. Então, me forçam a trabalhar mais para comprá-los. E trabalhar mais me força a consumir mais energia. E mais energia requer mais alimento. Não, não. Comigo não. Eu não vou entrar em um outro círculo vicioso, sendo que meu esforço está em sair de um.
Usar bicicleta... Ah, que lindo, ficaria com umas pernas bonitas, fortes. A saúde agradece. Mas em São Paulo? No Rio de Janeiro? Em Curitiba? Em Campinas? Em Natal? Em Manaus? Quanto tempo levaria no percurso entre a casa e o trabalho? Quais os riscos de eu ser atropelada e, se não morrer, gastar uma fábula (de novo, algo aqui requer mais dinheiro) com hospital? E como voltar de noite sem correr o risco de ser assaltada?
O fato é que esse tipo de movimento ignora totalmente a realidade de grande parte das pessoas. Fazendo isso, ações possíveis, como procurar comprar e preparar uma quantidade de alimentos que não sobre e não vá parar na lata do lixo - factível para qualquer um - são colocadas num balaio de gato como "não aos transgênicos", "plante uma árvore" e "viva os golfinhos". Nada contra golfinhos. Se puder plantar uma árvore, plante! Nada a favor de transgênicos. Mas iniciativa assim vira rótulo, modinha. Não pega. Ou melhor, pega, para os 5% da população que pode andar de bike, comprar alimentos orgânicos, pagar por um óleo de soja mais caro porque ele não tem soja transgênica e tem espaço pra cultivar uma árvore.
E vi que um dos líderes do tal movimento no Brasil, a "otoridade", cobra palestra para ensinar as pessoas a viverem uma vida mais simples. Catzo! O movimento se baseia na diminuição do consumo e o cara vem oferecer palestras, artigos, e daqui a pouco livros, DVDs e o cacete a quatro! No site que dizem ser o mais representativo desse tal de simplicidade voluntuária, o canal com as dicas importantes, que se poderia aplicar no dia-a-dia, está em branco. Mas tá lá a oferta de atividades - essas pagas. Bem, você pode negociar se não tiver como pagar o que querem.
Contradição pouca é bobagem... Enfim, mais um rótulo que se transformou em produto-serviço para algum esperto ganhar dinheiro e para um bando de lesados se reunir e destacar em suas reuniões como são criaturas superiores, espertas e generosas em relação ao futuro do planeta. Modinha, pura modinha!
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008
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